domingo, 2 de dezembro de 2012

Capítulo 6 (Opúsculo-A Paródia)


6 - BOSQUES
NÃO CONSEGUI DORMIR NAQUELA NOITE. TINHA MEDO de que houvesse uma sanguessuga do lado
de  fora  da  minha janela. Tinha  medo de  que  ela tivesse  pronta  para  pular pela  janela  e  então rastejar par a
dentro do  quarto, usando  seus sensores  de  hemoglobina  para descobrir  onde  todo  o  meu  sangue  estava.  O
problema em exalar um  belo aroma de sangue é que  todo mundo  vai querer um pouco. Levantei  e fechei  a
janela.  Mas  isso  somente  causou  uma  nova  onda  de  temores,  porque  o  aconteceria
se  a  sanguessuga  já
estivesse no  quarto?
O  que  aconteceria  se  Edwart  estivesse  mancomunado com ela, e  a  sanguessuga
fosse
meramente  um  pau-mandado  dele,  escondendo-se  embaixo  da  minha  cama  ate  que  eu  adormecesse?  Uma
coisa era Creta – eu não a impediria de fazer o seu trabalho. Esse não era o modo de fazer a minha parte pela
economia. Escancarei a janela e voltei para a cama.
Fiquei me revirando durante alguns minutos. Por sorte, minha distraída mãe havia se lembrado de colocar a
injeção de tranqüilizante que eu costumava usar nela quando ela estava de mau humor. Apliquei-a em mim e
cai num sono profundo. Ela também havia colocado na mala nosso video cassete e o seu anel de diamantes.
Apesar do tranqüilizante, eu ainda estava nervosa na manhã seguinte. O que Edwart ia fazer comigo? Estaria
me colocando em grave perigo? Por que uma  sanguessuga sugando meu sangue  me  aborrecia, mas não  um
vampiro? Mais importante, como iria conciliar o fato de usar um vestido de baile e, ao mesmo tempo, parecer
despreocupada  com  minha  aparência?  Terminei trocando  o  vestido  do  baile por  uma camisa convencional,
mas uma camisa convencional de menina. Você podia dizer isso pelos bolsos.
Escutei uma batida na porta e inspirei profundamente. Como Edwart er a gentil em bater, na porta e inspirei
profundamente arrebentar a porta. Eu a abri cheia de expectativa.
Era o carteiro, sorrindo para mim com aquele típico sorriso de Switchblade.
- Oi – ele disse. – Tempo agradável, não?
Desvie-me sem jeito. Sentia-me confortável falando de um monte de coisas, mas não sobre o tempo. Eu não
entendia  muito  da  terminologia,  pois  havia  perdido  a  aula  na  qual  você  aprende  sobre  as  condições
atmosféricas variáveis.
- Sim, o sol está brilhante hoje – conjecturei, hesitante.
- Bem, diga a seu pai que eu disse alô.
Foi quando finalmente compreendi. Ele estava apaixonado por mim. Estava tudo lá – a campainha, a posição
da  porta,  a exibição  de seus conhecimentos sobre  o clima. Será que  não havia  outras meninas  nesta  cidade
com quem dividir a responsabilidade de provocar paixões?
Apanhei a única carta que ele tinha para nós. Era da Companhia de Gás e Eletricidade de Switchblade. Não
imaginava que tivesse admiradores por lá também, mas não fiquei tão surpresa. Atirei-a no cesto de lixo com
as cartas de amor da receita Federal e fechei a porta sem responder.
Fui para a cozinha tomar um café da manha antes que Edwart chegasse. O café da manha é a refeição mais
importante  do  dia,  e  este  era  o  meu  dia  mais  importante  do  ano.  Tomaria  dois  cafés  da  manha  em
reconhecimento a isso.
Papai estava na cozinha, como sempre,  com dificuldade em mexer nas  gavetas. Ele nem  conseguia colocar
seu próprio cereal na tigela! Eu ficava imaginando como ele havia consegui viver sozinho antes de chegar.
- Aqui está uma
tigela,
pai – eu disse.
- Uma o quê?
- É  como um prato, mas  com lados – expliquei. Quando a tirei para fora do guarda-louças,  acidentalmente
arremessei-a na direção do ventilador de teto. Peguei outra tigela e dei para meu pai. Ele ficou para ela até eu
derramar o cereal dentro.
- Aqui, pai. Aqui esta a colher. Coma seu cereal com a colher.
- Obrigado,  Belle – ele disse  com sinal de apreço. Ele era muito sem  noção, mas  pelo menos conseguia se
alimentar  sozinho,  o  que  eu  não  podia  dizer  da  minha  mãe.  Eu  costumava  fazer  aquela  coisa  de  olha  o
aviãozinho para alimentá-la,  mas  então um avião  caiu perto de nossa  casa  e  isso  a  assustou. Depois  disso,
passei a imitar carros voadores, o que grosseiramente o mesmo som, mas num registro mais baixo.
- E então, Belle, o que há de novo hoje?
- Pai – eu disse, agarrando suas mãos e olhando diretamente em seus olhos – Estou sentindo o mais profundo
amor que já houve na historia do mundo.
- Meu Deus, Belle. Quando alguém  te pergunta  o que há de novo? , a resposta correta    nada demais . Alem
disso, não é um pouco cedo demais para afastar-se do resto  de seus colegas, dependendo de namorado para
satisfazer suas necessidades sociais em vez de fazer  amigos? E imagine o que   aconteceria  se alguma coisa
forçasse o garoto a partir! Estou imaginando páginas e páginas do que aconteceria, com nada alem de nomes
de meses sobre elas.
-  Se Edwart  algum dia  se fosse,  encontraria outro  monstro  para  sair  comigo.  Você  sabe  que  não  gosto  de
pessoas reais. Não tenho habilidades sociais – eu disse. – Puxei de certo modo – sorri generosamente. Eu não
era geralmente assim emocional com ele, e em senti bem.
Minha  mente  saltou  para minha  preocupação  principal. Precisava  que  ele saísse  de  casa  –  pais  são muito
prejudiciais quando namorados aparecem. Tive muitas experiências com isso antes em Phoenix, onde minha
mãe sai de casa sempre que um menino aparecia,
forçando-me
a encontrar uma maneira de entretê-lo quando
era ela quem o tinha convidado em primeiro lugar.
- Ei, pai – eu disse. – Por que não vai pescar?
- Sim, acho que devo ir pescar hoje. Ou não era hoje? Eu achava que era hoje. Eu esqueço!
-  Era  hoje  –  afirmei,  militar-estrategicamente.  –  Por  que  você  não  experimenta  o  lugar  de  pescaria  mais
distante? Dessa maneira, chegaria em casa mais tarde.
-  Parece-me  uma idéia  muito  boa! –  disse  ele. – talvez  eu  leve  aquele  amigo de cadeira  de  rodas comigo.
Gosto de pescar o dia todo quando você esta em casa – ele disse ao sair. – não estou acostumado a dividir uma
casa com outra pessoa. É exaustivo!
Então era isso. Jim  estava  fora de casa e não se importava que  eu tivesse planejado ver Edwart. Ninguém
mais poderia saber que estávamos indo a um encontro, no entanto eu precisava proteger Edwart em caso de
algo acontecer. Além disso, nunca tinha saído com um cara fogoso assim antes, então enviei um email vago
para toda a classe dizendo  Edwart Mullen e Belle Goose estão totalmente juntos .
De  repente,  escutei  uma  batida  na  porta.  Espiei  através  do  buraquinho,  que  como  minha  mãe  e  eu
chamávamos o olho mágico porque a palavra  olho  provoca nela um ataque de riso.
Era Edwart.
-  Só  um  segundo!  –  gritei,  agarrando  umas  revistas  e  correndo  para  o  banheiro. –  Tenho  algumas  coisas
humanas pra fazer – disse.
O banheiro era onde eu guardava o espremedor de suco. Espremi alguns
grapefruits
em cima de minhas veias
para obter meu odor característico extra-apetitoso de sangue.
- Belle – ele disse, quando finalmente abri a porta da frente.
- Edwart – repliquei, demonstrando que eu, também, tinha passado  uma hora em meu quarto, memorizando
seu nome.
De  repente,  ele  começou  a  rir.  Teria  eu  dito  alguma  coisa  engraçada?  Ou  ele?  Quanto  tempo  eu  estive
atordoada, lentamente tomando consciência de que me mataria só por causa de uma risada.
Mal sabiam eles
que eu estava organizando uma rebelião.
-  Estamos usando  as  mesmas  roupas –  ele  disse.  E  era verdade.  Ele  também  estava  vestindo  uma  camisa
branca convencional. De fato, uma camisa convencional de mulher. Ele também estava usando  um clipe de
cabelo que parecia um pouco feminino. Ri também, e então parei quando vi que ele parecia melhor que eu, e
então voltei a rir porque tudo o que eu queria er a que ele fosse feliz.
- Vamos, Belle. Existe uma coisa que quero te mostrar.
- Aonde estamos indo?
- A um lugar
arriscado.
-  Itália?  –  perguntei,  com  base  em  fundamentos.  Apensar  dos  Italianos  serem  conhecidos  por  sua  pele
bronzeada e sua cozinha carregada de alho, eu sabia, graças ás minhas pesquisas, que a família mais poderosa
de vampiros havia decidido viver lá pra sempre.
- Você verá – disse ele, misteriosamente. – Ah, Belle, acho que seria melhor você trocar seus sapatos por uns
mais resistentes.
Olhei para os meus pés. Mais resistentes que minhas galochas especiais á prova de fogo? Acho que tinha um
par de botas de caminhada.
-  Você  nunca  sabe  o  que  estará  á  espreita  a  quilômetros  e  quilômetros  de  planalto  cheio  de  mato...-  ele
acrescentou,  soltando  outra pista-chave. – Você também vai  precisar  de um tanque de oxigênio, uma tenda,
rações para uma tarde e seu próprio
sherpa
Vamos escalar a montanha do morto.
Estremeci.  Cada  parte  do  meu  corpo  me dizia  para  não  embarcar nessa  aventura  –  cada  parte  menos  meu
coração, que realmente precisava de exercício.
- Mas Edwart, não tenho nenhuma dessas coisas.
-  Nem  eu  Belle –  ele  de  um  passo  adiante  e  inspirei  seu  perfume  almiscarado,  ensopado  de  Axé.  –  Sem
oxigênio não serei um problema só para mim lá em cima. Serei uma responsabilidade para
você.
Ele fez uma pausa. Arregalei os olhos de medo, uma boa maneira de encobrir um terrível silêncio que você
não sabe como preencher .
-  Vê  como  é  arriscado?  –  ele  continuou.  –  Levar  você  lá  para  cima  sem  tomar  nenhuma  precaução  de
segurança, como minha medicação contra ansiedade? Você, responsável por minhas ações pelo resto da tarde?
– ele cambaleou, embriagado.
Concordei com determinação.
- Meu bem-estar emocional depende demais de você para eu ficar longe.
-  Graças  a Deus –  ele  disse. – Eu preferia, no  entanto,  que  você  tivesse me  dito  isso antes  de  jogar  meus
remédios na privada. Eu realmente desejava que você tivesse me dito isso antes – ele me atirou uma pequena
rede. – se a qualquer momento, enquanto estivermos subindo, eu me arrastar para dentro da vegetação ou para
outro espaço misterioso, simplesmente pendure a rede em seu ombro e me balance por um tempo.
Coloquei-a em minha bolsa e destranquei meu caminhão. Dei um passo para abrir a porta e imediatamente
caí.
Tão
Belle.
- Você parece exausta – disse Edwart, enquanto entravamos no carro.
- É, não consegui dormir tão bem a noite passada.
- Nem eu – disse ele, enquanto saíamos apressadamente.
- Sim, aquelas sanguessugas noturnas estão se tornando uma preocupação grande, não estão?
- Oh, Belle – ele riu suavemente. – Quando você fala assim, fico com medo e, se continuar a fazer isso, serei
obrigado a notificar as autoridades – sua risada era como o canto de milhares de sereias másculas.
Encostei o carro no estacionamento no fim do nosso quarteirão.
- Aqui estamos – anunciei. – O início da trilha do Morto.
Saltei do carro, inflei minha bola para exercícios de estabilidade do tronco e comecei meus alongamentos.
- Seu pai se importaria se fossemos por essa trilha? – Edwart perguntou. – Nesta estrada?
- O que Jim não sabe não o afeta – joguei meu estomago sobre a bola e fiz o alongamento em que você a deixa
ir aonde ela quer.
- Você não diz a seu pai onde vai estar? Nossa, Belle! Não sei se posso assumir esse risco! – ele começou a
ficar ofegante e seu nariz esguichou sangue. – Ótimo. E agora, isto – disse ele, segurando o nariz, com uma
voz anasalada como a de Alvin, o Esquilo.
Eu o coloquei sobre a bola e apoiei sua cabeça contar ela.
- O que aconteceria se você não chegasse em casa antes do jantar? – ele continuou a dizer durante. – O que
acontecera se Jim não fizer um  prato extra pra você porque pensa que você já  comeu?
Então
, onde de você
estaria?
- Ele sabe que estou você.
- Isso será de pouca utilidade quando estivermos abandonados na estrada. Para sempre. É uma boa coisa meus
pais terem inserido um chip no meu braço que lhes diz onde estou e lista as maneiras possíveis de como eu
poderia me perder.
- Sinto muito – eu disse, mas não sentia de fato. Quando  caras rangem os dentes  e franzem as sobrancelhas
numa expressão preocupada,  furiosa, isso significa que encontraram sua alma  gêmea. Além disso, sua raiva
tinha posto suas glândulas sudoríparas hiperativas para funcionar, fazendo-o rasgar sua camisa. Quando ele se
levantou para caminhar pela estrada, agachando-se aqui e ali para examinar o terreno, a musculatura de seus
braços vibrava como bastões de queijo provolone.
No céu, havia uma única nuvem, pequena como um disco, cobrindo precisamente o sol. Olhei  detidamente
para Edwart.  Ocorreu-me que nunca o tinha  visto á  luz  direta do sol. E, bem interessante,  eu nunca o tinha
visto  brilhar.  Poderiam  as  duas  coisas  estar  relacionadas?Eu  tinha  teoria  de  que  a  luz  do  sol  alterava
drasticamente a aparência de um vampiro; assim como a luz verde os fazia parecer doentes.
- Estou pronta, quando você estiver – eu disse, minha pele descascando no calor (mas, significativamente, não
luminoso)  quente.  Edwart  voltou-se  e  eu  gritei.  Novamente,  ele  estava  vestindo  o  mesmo  que  eu:  uma
blusinha branca, justa. Como não tinha percebido isso quando ele chegou? Algumas vezes, o manto que minha
imaginação constantemente projeta sobre suas costas distorce o modo como percebo a realidade.
Entretanto, Edwart tinha feito alguns  melhoramentos. Ele havia cortado a camisa pelo meio  e aplicado um
zíper, que ele agora abria ate seu umbigo. Sua carne nua brilhava translúcida, revelando as veias azuis sobre
seu  peito  com  dois  pelos.  A  camisa  ajustava-se  perfeitamente  á  sua  barriga  côncava,  destacando  todas  as
costelas protuberantes, não deixando nada para a imaginação. Seu pescoço irradiava como um deus por cauda
de todos  os  diamantes falsos que ele tinha colado no decote do seu top. Baixei os  olhos para  minha  camisa
simples sem zíper. Estava começando a me cansar do método competitivo de cortejar de Edwart.
Vamos ver
quem vence na corrida de sacos de batata, pensei maliciosamente. Venho praticando há anos.
- Vamos, ele disse – começamos a subir a estrada para a montanha do Morto. A estrada fazia curvas em torno
de  bosques  em  aclive.  Nos  bosques,  vimos alguns besouros e  vermes.  Menciono  isso porque,  agora  que os
mamíferos fizeram fugir o pouco que a natureza cria perto da civilização, temos de nos animar com as coisas
pequenas.
Edwart continuava consultando seu mapa para que não nos perdêssemos. Quando nos perdemos de fato, ele
teve a clareza mental de pegar sua tenda para que pudéssemos acampar pela noite. Então, tirei meus binóculos
e encontrei o topo da colina, 20 metros a nossa esquerda. Seguimos adiante ate a estrada chegar a uma parada
abrupta no meio de um campo. Um carro vinha subindo, parou e fez meia-volta. Saltei para o meio do campo
e  continuei  saltando  e saltando  por ali. Nunca  tinha me sentido  tão  livre. Nunca tinha  cantado  o tema de
A
Noviça Rebelde
em voz alta. Era belo. Havia maravilhosas ervas daninha em toda parte, além daquelas flores
amarelas que, quando assim, parecia estranhamente familiar.
- É o meu quintal? – perguntei.
Edwart estava de pé, recostado contra uma arvore dos bosques que bordejavam o prado.
- Não, Belle. Estamos pelo menos a cinco minutos de sua casa.
- Oh – repliquei. Eu era muito ruim em estimativa. Isso era uma coisa estranha, mas tudo parecia tão familiar
que  eu  adivinhei  que  milhões  de  garotas  no  mundo  todo  poderiam  se  identificar  com  isso.  De  repente
envergonhada,  olhei  para  Edwart,  que  estava  na  sombra,  observando-me prostrada  em  reverencia aos  oitos
espíritos do vento.
-  Não  havia  uma  coisa  que  você  queria me  mostrar? – lembrei-o. Algo  sobre o
Elasticidade de Preços?
perguntei, sua deslumbrante transformação á luz do sol.
- Oh! Certo. Feche os olhos e conte até cem.
Fechei os olhos e contei extravagarosamente,  um  mississippi, dois mississippis, três mississippis... . Então,
distraí-me e comecei a pensar sobre o mississippi. Haveria vampiros no mississippi? Chovia lá? Por um breve
segundo, esqueci que numero vinha depois de 79.
Depois de ter  contado até cem  por dez  vezes  seguidas, começando de  novo todas  as vezes em que Edwart
gritava  ainda não , abri os olhos e fiz uma aba com a mão para protegê-los de sol, que agora estava bastante
exposto no céu claro. O que vi me desnorteou. Edwart estava de pé no meio do campo, todo iluminado. Sua
pele  tinha  se  transformado  num  tom  de  vermelho  caro  de  bombeiros,  e  o  suor  pingando  de  cada  poro
intensificava a ilusão de sua cabeça fosse um tomate brilhante.
Em sua mão havia uma pá, e a seus pés, um buraco.
- Isso é o quero te mostrar – ele disse.
- Já estou familiarizada com Besouros – eu disse, habilidosamente atirando um para dentro da boca.
- Ouça, Belle. Esse é um segredo que só posso confiar a você – ele inclinou-se para o buraco e arrancou de lá
um andróide de formato humano. – Ainda está com medo?
- Não. É belo – dei um passo adiante para tocar seu braço, Edwart ficou rígido.
- Desculpe – ele disse. – Não estava preparado para o seu movimento. Quando se está ás voltas com andróides
o dia todo, você se acostuma a controlar quando e como as pessoas se movem. Toda essa coisa de interação
humana, bem... leva um tempo pra você se adaptar.
- Esta tudo bem – então eu era o único humano com qual Edwart tinha contato. Caminhei na direção daquilo
mais vagarosamente, tentando fazer justiça humanitária. – O que é isso, exatamente?
- É um  andróide movido  a energia solar anatomicamente correto. Eu o  mantenho  neste  prado ensolarado  e
isolado  para  que  possa  se  carregar  tranquilamente  sem  temer  que  aqueles  rivais  da  Competição  Anual  de
Robótica o seqüestrem. Depois, eu o desligo e o enterro por precaução.
- O que ele faz?
- Permita-me demonstrar – ele ligou o robô, e os seus olhos brilharam com uma luz vermelha. Ele ergueu-se
devagar cada junta entrando em seu devido lugar. Quando alcançou sua altura total, sua cabeça voltou-se na
minha direção. Então, ele caiu para trás no chão, como um suflê arruinado, antes de começar a se levantar de
novo, outra vez e outra vez?
-  É.  Veja  sua  luta.  Olhe  quantos  músculos  sintáticos  ele  tem  que  usar.  O  corpo  humano  é  uma  coisa
extraordinária – ele tocou minha mão. – Sinta quão suave fiz sua pele.
Quando ele puxou minha mão, inclinei-me, hipnotizada pela face de Edwart. Meus lábios foram atraídos para
mais perto de sua boca cheia de aparelhos dentais.
- Ahhhhh!
Edwart estava  rolando  no chão, os braços esticados  como  um  rolo de abrir  massa. Minhas  ações rápidas o
tinham apanhado de surpresa outra vez.
- É minha  culpa – ele  uivou,  ainda rolando. – Não  posso  beijá-la ate que estejamos  saindo  oficialmente.  É
parte das  Regras  – ele parou de rolar e sentou-se, sua respiração agitada quando se levantou – Isabelle. Isa.
Izzy. Belly
- Belle. Você vai sair comigo? Não quero dizer fisicamente, podemos permanecer dentro de casa
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e trabalhar no website que promove este robô o quanto você quiser. Quero dizer hipoteticamente. Quer dizer,
se você fosse sair para algum lugar com alguém, esse alguém seria eu. E o lugar seria uma casa de fliperama.
Olhei dentro dos olhos dele e vi a coisa que ele não conseguia dizer:  Todos os momentos em que olho pra
você preciso de toda minha disciplina para não tomá-la em meus braços e beber da fonte do seu pesco.
- Não estou com medo de você, Isa-Edwart – eu disse, falando seu nome completo tão suavemente quanto ele
havia dito o meu.
- Verdade? Você ainda não está com medo de mim? Eu te asseguro, sou um cara incrivelmente assustador!
- Ele ficou ali de pé por um minuto, pensando, e então saiu correndo pelo campo.
- Como se você pudesse correr mais do que eu! – ele gritou.
- Como se você pudesse lutar mais do que eu! – ele esmurrou o ar.
- Como se você pudesse subir mais alto do que eu! – ele abraçou-se a uma arvore e tentou envolve-la com as
pernas, antes de cair no chão e trotar de volta para mim, colocando suas mãos na cabeça  para maximizar o
fluxo de Oxigênio.
-
Agora
está com medo?
Agora
vai sair comigo?
Isso  me  pegou  de  surpresa.  Pedir  permissão  era  algo  que  somente  cavaleiros  de  séculos  passados  faziam.
Então lembrei-me de quão velho Edwart realmente era – que há centenas de anos ele conviveu com Napoleão
e Jesus.
- Sim, Edwart. Sim – eu estava tão atraída por ele que poderia ter feito xixi nas calças, mas já algum tempo eu
não fazia mais isso. Eu era mais velha agora e dominava meus sentimentos em momentos como este abrindo e
fechando meus punhos bem rápido.
- Ótimo! – ele disse, e então olhou fixamente para mim. Olhei de volta para ele. Deitei-me sobre a relva. Ele
deitou-se  ao  meu  lado. Imprimimos nossas formas sobre  a  grama  em  movimentos  sincronizados.  O  tempo
voou como se fosse um sonho.
- Belle – ele disse. – É hora de ir.
- Já?
-  Passaram-se  cinco  horas.  Ficamos  deitados  na grama  olhando  um  para  o  outro  durante  cinco horas.  Por
favor... preciso mesmo ir para casa.
Concordei sonolenta.
- Você acha que poderia me carregar nas costas até o carro com sua super força? Nem todo mundo pode correr
através de uma floresta densa a mais de 160 km/h, você sabe.
-  Mais de  160  km/h? caramba – ele  murmurou,  mas  respirou  fundo –  O.k. Belle. Mais  de  160 km/h,  aqui
vamos nós – ele tirou um saco de dormir de dentro da sua mochila de acampamento.
- Feche os olhos e ponha seus braços em torno do meu pescoço.
Fiz o que ele pediu. A principio, senti que nós estávamos abaixando até o chão, rapidamente. Então, tive a
sensação  confortante  de  maciez  embaixo  das  panturrilhas.  Edwart  remexeu  o  traseiro  e  lá  fomos  nós,
acelerando colina abaixo.
Quando me senti segura o suficiente par a abrir os olhos, meu caminhão estava á nossa frente.
Edwart estava de pé, tirando o pó de cima da sua roupa. O sol havia se posto, mas imaginei ter percebido um
fraco reflexo de vermelho ardente assombrando a pele dele.
-  Leve-me  até  o  carro,  por  favor.  O  motor  zumbiu  gentilmente,  harmonizando-se  com  o  súbito  ataque  de
roncos de Edwart. Olhei para o doce vampiro, a baba escorrendo de sua boca aberta pelas suas bochechas. De
repente, ocorreu-me que,  depois de  toda aquela dança saltitante nos prados,  ele não tinha me beijado. Teria
sido por causa do fungo crescendo em minhas cavidades nasais? Ou pelo fato de que a única maneira de tratar
o fungo fosse derramar gordura fervendo no meu nariz, massacrando suas colônias? Ou ele estava aborrecido
porque, profundamente em meu coração, eu considerava o fungo parte de mim?
Não. Ele não poderia saber disso. O fungo no nariz era um segredo que eu carregaria comigo até a cova.
A cova!
Não havia escapatória. Um dia, eu morreria numa bela explosão, mas Edwart continuaria vivendo.
Talvez fosse por isso que  ele não tinha  me  beijado. Talvez não  pudesse suportar estar  ligado a  uma pessoa
tragicamente destinada a se transformar num milhão de partículas brilhantes.
Olhei para seu corpo pequeno curvado no assento de passageiros. Dentro de um ano, eu completaria dezoito,
mas Edwart ainda teria dezessete. Ele ainda teria a estrutura física de um menino de doze anos, mas eu teria
pelancas, gordura pós-parto e reumatismo.
Não  podia  culpá-lo  por  não  querer  me  beijar.  Quem  iria  querer  beijar  um  par  de  lábios  que,  a  qualquer
momento, poderiam se transformar num velho e enrugado monte de pó?
A  menos  que  eu,  também,  tornasse-me  uma  vampira!
Nada  afastaria  os  lábios  de  Edwart  dos  meus  se
fossemos
ambos
imortais.  Tudo o  que  Edwart  tinha  de  fazer  era  me  morder  e  ele  nunca  mais  teria  de  se
preocupar sobre as belas memórias que eu perderia para o Alzheimer na época da faculdade.
Sobre três coisas eu estava absolutamente certa. Primeira, Edwart talvez fosse, muito provavelmente, minha
alma  gêmea.  Segunda,  existia  uma  parte  do  vampiro  dentro  dele  –  que  eu  presumia  que  estivesse
completamente  fora  de  seu  controle  –  que  queria  me  ver  morta.  E  terceira,  eu  incondicionalmente,
irrevogavelmente, impenetravelmente, heterogeneticamente e ginecologicamente desejava que ele tivesse me
beijado.

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