Capítulo 2 Pronta para ser Trancada
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Luce tinha um pedaço de papel com seu horário imprimido,
um caderno vazio pela
metade que ela começava a prender na Dover em sua aula de
História da Europa
Avançada ano passado, dois lápis número dois, sua
borracha favorita, e a repentina
sensação ruim que Arriane podia estar certa sobre as
aulas na Sword & Cross.
O professor ainda estava para se materializar, as
carteiras débeis estavam
arrumadas em fileiras a esmo, e o armário de suprimentos
estava com uma barreira
de pilhas de caixas empoeiradas na frente dele.
O que era pior, nenhum dos outros garotos parecia notar a
desarrumação. De fato,
nenhum dos outros parecia notar quem estava numa sala de
aula. Todos estavam
amontoados perto das janelas, dando uma última fumada no
cigarro aqui,
reposicionando os alfinetes extra-largos em suas
camisetas ali. Só Todd estava
sentado numa carteira mesmo, talhando algo intrincado em
sua superfície com sua
caneta. Mas os outros alunos novos pareciam já ter achado
seu lugar na multidão.
Cam estava com os caras que pareciam os mauricinhos da
Dover em um
amontoado apertado ao seu redor. Eles deviam ter sido
amigos quando ele se
matriculara na Sword & Cross da primeira vez. Gabbe
estava cumprimentando a
garota de língua com piercing que estivera se amassando
com o garoto de piercing
na língua do lado de fora. Luce se sentiu estupidamente
ciumenta que não fosse
ousada e bastante para fazer qualquer coisa exceto
sentar-se perto do nada
ameaçador Todd.
Arriane voou sobre os outros, sussurrando coisas que Luce
não conseguia entender,
como algum tipo de princesa gótica. Quando ela passou por
Cam, ele despenteou
seu cabelo recém-cortado.
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― Belo
esfregão, Arriane. ― Ele sorriu afetadamente, enfiando um fio atrás de
seu pescoço. ― Meus cumprimentos para o seu estiliMiss ―
Arriane bateu nele. ― Tire as mãos, Cam. O que quer
dizer: Nos seus sonhos. ― Ela
balançou sua cabeça na direção da Luce. ― E pode dar seus
cumprimentos para o
meu novo bichinho de estimação, bem ali. ―
Os olhos de esmeralda do Cam brilharam para Luce, que
endurece. ― Creio que
darei, ― ele disse, e começou a andar na direção dela.
Ele sorriu para Luce, que estava sentada com seus
tornozelos cruzados debaixo da
sua carteira e suas mãos dobradas elegantemente em sua
carteira fortemente
grafitado.
― Nós, alunos novos, temos que ficar juntos, ― ele disse.
― Sabe o que queo dizer?
―
― Mas achei que você já esteve aqui antes. ―
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estava de pé na janela, olhando-os com suspeita.
― Oh não, ela não
disse nada sobre você, ― Luce disse rapidamente, tentando se
lembrar se isso era verdade ou não. Estava claro que Cam
e Arriane não gostavam
um do outro, e mesmo Luce sendo grata por Arriane levá-la
por aí de manhã, ela
não estava pronta para escolher qualquer lado ainda.
― Eu lembro quando
era um novato aqui da primeira vez. ― Ele riu sozinho. ―
Minha banda tinha acabado de se separar e eu estava
perdido. Eu não conhecia
ninguém. Eu podia ter tido alguém sem ― – ele olhou para
Arriane ― – segundas
intenções para me mostrar o funcionamento. ―
― O que, e você
não tem segundas intenções? ― Luce disse, surpresa por ouvir um
ritmo paquerador em sua voz.
Um sorriso fácil espalhou-se pelo rosto de Cam. Ele
ergueu uma sobrancelha para
ela. ― E pensar que eu não queria voltar aqui. ―
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Luce corou.
Ela geralmente não se envolvia com roqueiros ― mas, também,
nenhum nunca tinha puxado a cadeira próxima a ela perto,
sentado ao lado dela, e
encarando-a com olhos tão verdes. Cam colocou sua mão no
seu bolso e puxou uma
palheta verde com o numero 44 impresso.
― Esse é o número
do meu quarto. Dê uma passada a qualquer hora. ―
A palheta não era muito distante da cor dos olhos do Cam,
e Luce se perguntou
como e quando ele imprimiu estas, mas antes que ela
pudesse responder ― e sabe
lá o que ela responderia ― Arriane bateu uma mão com força no
ombro de Cam. ―
Perdão. Não fui clara? Eu vi essa primeiro. ―
Cam bufou. Ele olhou diretamente para Luce enquanto
dizia, ― Viu, eu achei que
ainda havia uma coisinha chamada livre arbítrio. Talvez o
seu bichinho de estimação
tenha um caminho próprio em mente. ―
Luce abriu sua boca para alegar que é claro que ela tinha
um caminho, era só o seu
primeiro dia aqui e ela ainda estava desvendando o
funcionamento. Mas na hora
que ela foi capaz de endireitar as palavras em sua
cabeça, o sinal de alerta de
minuto tocou e a pequena reunião na carteira da Luce
dissolveu-se.
Os outros garotos prenderam suas carteiras ao redor dela,
e logo parou de ser tão
notável que Luce sentou-se empertigada e formal em sua
carteira, mantendo seus
olhos na porta. Ficando de olho em Daniel.
De canto de olho, ela conseguia ver Cam roubando
olhadelas para ela. Ela se sentiu
lisonjeada ― e nervosa, então frustrada consigo mesma.
Daniel? Cam? Ela estava
nessa escola a o que, quarenta e cinco minutos? ― e sua
mente já estava balançada
por dois caras diferentes. A razão principal por ela
estar nessa escola era porque da
última vez que ela ficara interessada num cara, as coisas
tinham ficado horrível,
horrivelmente ruins. Ela não podia se permitir ficar toda
enamorada (duplamente!)
em seu primeiríssimo dia de aula.
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Ela olhou para Cam, que piscou novamente para ela, então
tirou seu cabelo
escuro de seus olhos. Tirando a chocante beleza ― é, tá
certo ― ele realmente
parecia uma pessoa útil a se conhecer. Com ela, ele ainda
estava se ajustando ao
cenário, mas claramente já tinha passado pelas quadras da
Sword & Cross algumas
vezes antes. E ele era legal com ela. Ela pensou na
palheta verde com o número do
seu quarto, esperando que ele não as desse livremente.
Eles podiam ser... amigos.
Talvez isso fosse tudo que ela precisasse; Talvez então
ela pudesse parar de se
sentir tão obviamente fora de lugar na Sword & Cross.
Talvez então ela fosse capaz de perdoar o fato que a
única janela na sala de aula
fosse do tamanho de uma carta de negócios, endurecida com
lima, e olhar para fora
para o massivo mausoléu no cemitério.
Talvez então ela fosse capaz de esquecer o odor de
peróxido de fazer o nariz coçar
emanando da garota punk com cabelo loiro de
água-oxigenada sentada na frente
dela.
Talvez então ela realmente pudesse prestar atenção ao
professor severo e
bigodudo que marchou para a sala de aula, comandou que a
turma
endireitasseesentasse, e fechou a porta firmemente.
O menor dos beliscões de decepção cutucou seu coração.
Ela levou um momento
para rastrear de onde tinha vindo. Até o professor fechar
a porta, ela tivera uma
mínima esperança que Daniel estivesse em sua primeira
aula também.
O que ela tinha na próxima aula, francês? Ela olhou para
seu horário para checar em
que sala era. Bem então, um papel de avião deslizou por
seu horário, errou sua
carteira e caiu no chão perto de sua bolsa. Ela checou
para ver se alguém tinha
notado, mas o professor estava ocupado acabando com um
pedaço de giz
enquanto escrevia algo no quadro.
Luce olhou nervosamente para sua esquerda. Quando Cam
olhou para ela, ele lhe
deu uma piscadela e um acenozinho flertante que fez com
que seu corpo todo
ficasse tenso. Mas ele não parecia ter visto ou ser
responsável pelo avião de papel.
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― Psiiiiu, ―
veio o baixo sussurro atrás dele. Era Arriane, que fez um
movimento com seu queixo para que Luce pegasse o avião de
papel. Luce se
abaixou para apanhá-lo e viu seu nome escrito em pequenas
letras pretas na asa.
Seu primeiro bilhete!
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Já está procurando pela saída?
Não é um bom sinal.
Estamos nesse inferno até o almoço.
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Isso tinha que ser uma piada. Luce checou novamente seu horário e
percebeu com
horror que todas as suas três aulas eram nessa mesma sala
1 ― e todas as três
seriam lecionadas pelo mesmo Sr. Cole.
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Ele tinha se desprendido do quadro-negro e estava
atravessando sonolentamente a
sala. Não houve introdução para os novatos ― e Luce não
conseguia decidir se
estava ou não feliz por isso. O Sr. Cole meramente jogou
um roteiro de estudos em
cada carteira dos quatro novos estudantes. Quando o
pacote grampeado pousou na
frente de Luce, ela se inclinou para frente, ansiosa para
olhar. História do Mundo, lia-
se. Logrando a
Ruína da Humanidade. Hmmm, história sempre fora sua
melhor
matéria, mas logrando a ruína?
Um olhar mais apurado do roteiro de estudo foi tudo que
precisou para Luce ver
que Arriane estava certa sobre ser um inferno: uma cara
de leitura impossível,
TESTE em letras garrafais e em negrito todo terceiro
período, e um trabalho de
trinta paginas sobre ― sério? ― o tirano fracassado de
sua escolha. Parênteses
grosso e negros tinham sido desenhados com uma caneta
preta para retroprojetor
ao redor das tarefas que Luce tinha perdido durante as
primeiras semanas. Nas
margens, o Sr. Cole tinha escrito Venha me ver para uma Pesquisa Substituta. Se
houvesse um método efetivo de sugar a alma, Luce estava
assustada de descobrir.
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Pelo menos ela
tinha Arriane sentada ali atrás na próxima fila. Luce estava feliz
por já ter sido estabelecido e precedente por passar
notas de emergência. Ela e
Callie costumavam mandar mensagens uma para a outra
furtivamente, mas para
sobreviver aqui, Luce definitivamente teria que aprender
a fazer um avião de papel.
Ela arrancou uma folha de seu caderno e tentou usar o da
Arriane como modelo.
Após alguns minutos desafiadores fazendo origami, outro
avião pousou em sua
carteira. Ela olhou de volta para Arriane, que balançou
sua cabeça e girou os olhos
de um modo você-tem-tanto-a-aprender.
Luce desculpou-se dando de ombros e girou-se de volta
para abrir o segundo
bilhete:
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Ah, e até que esteja confiante na sua mira, é
melhor não mandar qualquer mensagem
relacionada ao Daniel na minha direção. O cara
atrás de você é famoso no campo de
futebol americano por suas intercepções.
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Bom saber. Ela nem ao menos tinha visto Roland, amigo do
Daniel, chegar por trás
dela. Agora ela se virava bem lentamente em seu assento,
até vislumbrar seus
dreadlocks de canto de olho. Ela ousou dar uma espiada no
caderno aberto na
carteira dele e captou seu nome todo. Roland Sparks.
― Nada de passar bilhetes, ― o Sr. Cole disse
severamente, fazendo com que Luce
virasse com tudo sua cabeça para prestar atenção. ― Nada
de plagiar, e nada de
olhar para os trabalhos dos outros. Eu não fiz faculdade
só para receber a atenção
parcial de vocês. ―
Luce assentiu em uníssono com os outros garotos
estupefatos bem quando um
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terceiro avião de papel deslizou até parar no meio de sua
carteira.
Só mais 172 minutos!
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***
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Cento e
setenta e três minutos torturantes mais tarde, Ariane guiava Luce para
a lanchonete. ― Que cê acha? ― ela perguntou.
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― Você estava
certa, ― Luce disse entorpecidamente, ainda se recuperando
do quanto suas três primeiras horas de aula tinham sido
sombrias. ― Por que
alguém lecionaria uma matéria tão deprimente? ―
― Ah, o Cole já
amolece. Ele coloca sua cara de nada-de-besteira toda vez que tem
aluno novo. De qualquer jeito, ― Arriane disse, cutucando
Luce, ― podia ter ficado
com a Miss Troz. ―
Luce olhou seu horário. ― Eu estou com ela em biologia na
parte da tarde, ― ela
disse com uma sensação de afundamento em seu estômago.
Enquanto Arriane cuspia uma gargalhada, Luce sentiu um
encontrão em seu
ombro. Era Cam, passando por elas no corredor a caminho
do almoço. Luce teria
caído estatelada se não fosse pela mão dele esticando-se
para firmá-la.
― Calma aí. ― Ele
lançou-lhe um rápido sorriso, e ela se perguntou se ele tinha
trombado nela intencionalmente. Mas ele não parecia tão
juvenil assim. Luce olhou
para Arriane para ver se ela tinha notado algo. Arriane
levantou suas sobrancelhas,
quase convidando Luce a falar, mas nenhuma delas disse
coisa alguma.
Quando eles cruzaram as janelas interiores poeirentas
separando o gélido corredor
da lanchonete ainda mais gélida, Arriane tomou o cotovelo
de Luce.
― Evite o bife de
frango frito a qualquer custo, ― ela instruiu enquanto seguiam a
multidão para o turvo refeitório. ― A pizza é boa, o
chili é bom, e o borsch 9na
verdade não é ruim. Você gosta de bolo de carne? ―
― Sou vegetariana,
― Luce disse. Ela estava olhando pelas carteiras, procurando
por duas pessoas em particular. Daniel e Cam. Ela
simplesmente se sentiria mais a
vontade se ela soubesse onde eles estavam, para que
pudesse continuar seu almoço
fingindo que não tinha visto nenhum dos dois. Mas até
agora, nada...
― Vegetariana,
hein? ― Arriane franziu seus lábios. ― Pais hippies ou sua própria
tentativa miserável de rebelião? ―
― Hãn, nenhum dos
dois, eu simplesmente não– ―
― Gosta de carne?
― Arriane girou os ombros de Luce noventa graus, para que ela
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olhasse diretamente para Daniel, sentado em uma carteira
do outro lado do
cômodo. Luce soltou uma longa exalação. Ali estava ele. ―
Agora, isso vale para
qualquer carne?
― Arriane cantarolou altamente. ― Tipo, você não afundaria seus
dentes nele? ―
Luce bateu com força em Arriane e arrastou-a na direção
da fila do almoço. Arriane
estava se matando de rir, mas Luce sabia que ela estava
corando violentamente, o
que seria dolorosamente óbvio nessa iluminação
fluorescente.
― Cala a boca, ele
total te ouviu, ― ela sussurrou.
Parte de Luce se sentia feliz por estar brincando sobre
garotos com uma amiga.
Supondo que Arriane fosse sua amiga.
Ela ainda se sentia desapegada pelo que tinha acontecido
essa manhã quando ela
vira Daniel. Aquela atração na direção dele ― ela ainda
não entendia de onde viera,
e ainda assim, aqui estava ela de novo. Ela se forçou a
afastar seus olhos do cabelo
loiro dele, da linha suave de sua mandíbula. Ela se
recusava a ser pega encarando.
Ela não queria dar-lhe qualquer razão para lhe mostrar o dedo do
meio pela
segunda vez.
Luce olhou para o outro lado da carteira, para o amigo de
Daniel, Roland. Ele estava
olhando diretamente para ela. Quando ele capturou seu
olhar, ele agitou suas
sobrancelhas de um jeito que Luce não conseguia entender,
mas que ainda a
assustava um pouquinho.
Luce se voltou para Arriane. ― Por que todos nessa escola
são tão esquisitos? ―
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― Vou
escolher não me ofender com isso, ― Arriane disse, pegando uma
bandeja de plástico e dando uma para Luce. ― E eu vou
seguir explicando a fina arte
de selecionar um assento na lanchonete. Veja, você nunca
vai querer se sentar
perto de ― Luce, cuidado! ―
Tudo que Luce fez foi dar um passo pra trás, mas assim
que ela o fez, ela sentiu o
duro empurrão de duas mãos em seus ombros. Imediatamente,
ela sabia que iria
cair. Ela apalpou à sua frente por apoio, mas tudo que
suas mãos encontraram foi a
bandeja de almoço cheia de outra pessoa. O negócio todo
caiu junto com ela. Ela
pousou com uma pancada no chão da lanchonete, uma xícara
inteira de borscht em
sua cara.
Quando ela limpou beterrabas esmagadas o bastante para
que seus olhos vissem,
Luce olhou para cima. A fadinha mais brava que ela já
tinha visto estava parada
sobre ela. A garota tinha cabelo oxigenada espetado, pelo
menos dez piercings no
rosto, e um olhar mortal. Ela arreganhou seus dentes para
Luce e sibilou, ― Se a sua
visão não tivesse arruinado meu apetite, eu faria você me
comprar outro almoço. ―
Luce gaguejou uma desculpa. Ela tentou se levantar, mas a
garota bateu o salto de
sua bota preta de salto agulha no pé de Luce. Dor subiu
por sua perna, e ela teve
que morder seu lábio para não gritar.
― Por que eu
simplesmente não deixo pra próxima? ― a garota disse.
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― Já chega, Molly, ― Arriane disse friamente. Ela se
abaixou para ajudar Luce a
ficar de pé.
Luce recuou. O salto agulha definitivamente iria deixar
uma marca.
Molly esquadrinhou seus quadris para encarar Arriane, e
Luce teve o
pressentimento de que essa não era a primeira vez que
elas trocavam faíscas.
― Amizade rápida
com a novata, eu vejo, ― Molly grunhiu. ― Esse é um
comportamento realmente ruim, A. Você não deveria estar
em condicional? ―
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Luce engoliu
em seco. Arriane não tinha mencionado nada sobre condicional,
e não fazia sentido que isso a proibiria de fazer novos
amigos. Mas a palavra fora o
bastante para fazer Arriane fechar seu punho e mandar um
gordo soco que acabou
no olho direito de Molly.
Molly cambaleou para trás, mas foi Arriane quem chamou a
atenção de Molly. Ela
começou a ter convulsão, seus braços para cima e
sacudindo no ar.
Era a pulseira, Luce percebeu com horror. Estava enviando
algum tipo de choque
pelo corpo de Arriane. Inacreditável. Essa era uma
punição cruel e incomum, com
certeza. O estômago de Luce revirou enquanto ela
observava todo o corpo
estudantil trepidar. Ela se esticou para pegar Arriane
bem quando ela afundava no
chão.
― Arriane, ― Luce
sussurrou. ― Você está bem? ―
― Ótima. ― Os
olhos negros de Arriane abriram-se vacilantemente, então se
fecharam.
Luce arfou. Então um dos olhos da Arriane abriu de volta.
― Te assustei, não foi? Ai,
que fofo. Não se preocupe, os choques não vão me matar, ―
ela sussurrou. ― Eles
só me tornam mais fortes. De qualquer jeito, valeu a pena
para dar um olho preto
praquela vaca, sabe? ―
― Certo,
afastem-se. Afastem-se, ― uma voz rouca rugiu atrás deles.
Randy estava parada na entrada, o rosto vermelho e
respirando violentamente. Era
um pouco tarde demais para afastar qualquer coisa, Luce
pensou, mas então Molly
estava inclinando-se na direção delas, seus saltos agulha
fazendo um som seco no
linóleo. A garota não tinha vergonha. Ela realmente iria
dar uma surra na Arriane
com Randy parada bem ali?
Felizmente, os braços fortes de Randy fecharam-se ao
redor dela primeiro. Molly
tentou chutar para se libertar e começou a gritar.
― É melhor alguém
começar a falar, ― Randy latiu, apertando Molly até ela ficar
frouxa. ― Pensando melhor, todas as três apresentem-se
para a detenção amanhã
de manhã. Cemitério. Ao raiar do dia! ― Randy olhou para
Molly. ― Já se acalmou?
―
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Molly assentiu
rigidamente, e Randy soltou-a. Ela se abaixou para onde
Arriane ainda estava deitada no colo de Luce, seus braços
cruzados sobre seu peito.
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De primeira, Luce achou que Arriane estava de mal-humor,
como um cachorro
bravo com um enforcador, mas então Luce sentiu um pequeno
choque do corpo de
Arriane e percebeu que a garota ainda estava à mercê da
pulseira.
― Vamos, ― Randy
disse, mais suavemente. ― Vamos te desligar. ―
Ela estendeu sua mão para Arriane e ajudou a puxar seu
minúsculo corpo trêmulo,
virando-se somente uma vez na entrada para repetir ordens
para Luce e Molly.
― Raiar do dia! ―
― Estou ansiosa
por isso, ― Molly disse docemente, abaixando-se para pegar o
prato de bolo de carne que tinha deslizado de sua
bandeja.
Ela balançou-o sobre a cabeça da Luce por um segundo,
então virou o prato de
ponta-cabeça e amassou a comida em seu cabelo. Luce
conseguia ouvir o esguicho
de sua própria mortificação enquanto toda a Sword &
Cross teve uma visão da
novata coberta por bolo de carne.
― Impagável, ―
Molly disse, puxando a menor das câmeras prateada de um bolso
traseiro em sua calça jeans. ― Diga... bolo de carne, ―
ela cantou, tirando algumas
fotos de rosto. ― Ficarão ótimas no meu blog. ―
― Belo chapéu, ―
alguém zombou do outro lado da lanchonete. Então, com
trepidação, Luce voltou seus olhos para Daniel, rezando
para que de algum modo
ele tivesse perdido a cena toda. Mas não. Ele estava
balançando sua cabeça. Ele
parecia chateado.
Até aquele momento, Luce pensava que tinha uma chance de
se levantar e
simplesmente chacoalhar o incidente ― literalmente. Mas
vendo a reação do Daniel
― bem, finalmente a fez entender.
Ela não choraria na frente de qualquer uma daquelas
pessoas horríveis. Ela engoliu
duramente, levantou-se, e se mandou. E se apressou na
direção da porta mais
próxima, ansiosa por sentir um ar frio em seu rosto.
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Ao invés, a
umidade sulista de setembro encobriu-a, sufocando-a, assim que
ela saiu. O céu tinha aquela cor de nada, um marrom
acinzentado tão
opressivamente brando que era até mesmo difícil achar o
sol. Luce diminuiu, mas
foi até a beirada do estacionamento antes de parar
completamente.
Ela ansiava ver seu velho carro demolido ali, afundar no
assento de pano esfiapado,
acelerar o motor, ligar o som, e dar o fora desse maldito
lugar. Mas enquanto ficava
parada na quente calçada preta, a realidade assentou: Ela
estava presa aqui, e um
par de portões elevados de metal separavam-na do mundo
fora da Sword & Cross.
Além do mês, mesmo que ela tivesse saída... para onde ela
iria?
A sensação doentia em seu estômago lhe dizia tudo que ela
precisava saber. Ela já
estava no fundo do poço, e as coisas estavam ficando bem
sombrias.
Era tão deprimente quanto era verdade: a Sword &
Cross era tudo o que ela tinha.
Ela deixou seu rosto cair em suas mãos, sabendo que tinha
que voltar. Mas quando
ela ergueu sua cabeça, o resíduo em suas palmas a lembrou
que ela ainda estava
|
encoberta pelo bolo de carne da Molly. Eca. Primeira
parada, o banheiro mais
próximo.
De volta lá dentro, Luce entrou no banheiro das garotas
bem quando a porta estava
abrindo. Gabbe, que parecia ainda mais loira e perfeita
agora que Luce parecia que
tinha dado um mergulho no lixão, passou por ela se
espremendo.
― Oopa, licença,
querida, ― ela disse. Sua voz com sotaque sulista era doce, mas
seu rosto se enrugou ao ver Luce. ― Ai céus, você está
horrível. O que aconteceu? ―
O que aconteceu? Como se a escola toda já não soubesse.
Essa garota
provavelmente estava se fazendo de burra para que Luce
revivesse toda a cena
mortificante.
― Espere cinco
minutos, ― Luce replicou, com mais aspereza em sua voz do que
pretendia. ― Tenho certeza que fofoca se espalha como a
praga aqui. ―
― Quer a minha
base emprestada? ― Gabbe perguntou, oferecendo um estojo de
maquiagem azul-pastel. ― Você não se viu ainda, mas você
vai ― –
|
― Obrigada,
mas não. ― Luce a cortou, entrando no banheiro. Sem se olhar
no espelho, ela ligou a torneira. Ela jogou água gelada
em seu rosto e finalmente
soltou tudo. Lágrimas escorrendo, ela apertou o
administrador de sabonete e
tentou usar um pouco do sabonete barato rosa empoado para
tirar o bolo de carne.
Mas ainda havia o problema do cabelo. E suas roupas
definitivamente já tinham
parecido e cheirado melhor. Não que ela precisasse mais
se preocupar em causar
uma boa impressão.
A porta do banheiro se abriu e Luce esbarrou contra a
parede como um animal
enjaulado. Quando uma estranha entrou, Luce endureceu e
esperou pelo pior.
A garota tinha uma estrutura corporal atarracada,
acentuada por uma quantidade
anormal de camadas de roupa. Seu rosto largo era cercado
por cabelo castanho
cacheado, e seu óculos roxo claro balançou quando ela
fungou. Ela parecia bastante
modesta, mas também, aparências enganam. Suas duas mãos
estavam colocadas
atrás de suas costas de um jeito que, depois do dia que
Luce tinha tido, ela
simplesmente não podia confiar.
― Sabe, você não
devia estar aqui sem um passe, ― a garota disse. Seu tom
parecia ser sério.
― Eu sei. ― O
olhar nos olhos dessa garota confirmou a suspeita de Luce de que era
absolutamente impossível fazer uma pausa nesse lugar. Ela
começou a suspirar em
rendição. ― Eu só– ―
― Estou brincando.
― A garota riu, girando seus olhos e relaxando sua postura. ―
Eu peguei shampoo do vestiário para você, ― ela disse,
trazendo suas mãos para
frente para mostrar duas embalagens plásticas de shampoo
e condicionador de
aparência inocente. ― Vamos, ― ela disse, puxando uma
cadeira de dobrar gaMiss
|
Um barulho parcialmente de lástima e parcialmente de
risada que ela nunca
havia feito antes escapou dos lábios de Luce. Soava, ela
achava, com alívio. A
garota realmente estava sendo legal com ela ― não só
legal do tipo colégio
reformatório, mas legal do tipo pessoa normal! Por razão
alguma. O choque disso
era quase grande demais para Luce aguentar. ― Obrigada? ―
Luce conseguia dizer,
ainda se sentindo um pouco cautelosa.
― Ah, e você
provavelmente precisa de uma muda de roupas, ― a garota disse,
olhando para seu suéter preto e puxando-o sobre sua
cabeça para expôr um suéter
preto idêntico abaixo.
Quando ela viu o olhar de surpresa no rosto de Luce, ela
disse, ― O quê? Eu tenho
um sistema imunológico hostil. Eu tenho que usar muitas
camadas. ―
― Ah, bem, você
ficará bem sem essa? ― Luce se forçou a perguntar, mesmo ela
fazendo quase tudo agora para tirar a capa de carne que
estava usando.
― É claro, ― a
garota disse, dispensando-a. ― Tenho mais três debaixo dessa. E
mais algumas no meu armário. Fique a vontade. Me machuca
ver uma vegetariana
coberta de carne. Sou muito empática. ―
Luce se perguntou como essa estranha conhecia suas
preferências alimentícias,
mas mais que isso, ela tinha que perguntar: ― Hm, por que
você está sendo tão
legal? ―
A garota riu, suspirou, então balançou sua cabeça. ― Nem
todos na Sword & Cross
são vadias ou atletas10. ―
― Hein? ― Luce disse.
― Sword &
Cross... Vadias e Atletas. Um péssimo apelido da cidade para essa
escola. Obviamente não há nenhum atleta aqui. Eu não irei
oprimir os seus ouvidos
com alguns dos apelidos mais rudes que inventaram. ―
Luce riu.
― O que eu quero
dizer é que, nem todos aqui são uns completos parvos.–
|
― Só a
maioria? ― Luce perguntou, odiando ela já soar tão negativa. Mas fora
uma manhã tão longa, e ela já tinha passado por tanto, e
talvez essa garota não a
julgasse por um ser uma tontinha irritada.
Para sua surpresa, a garota sorriu. ― Exatamente. E eles
certamente dão ao resto
de nós uma má reputação. ― Ela estendeu sua mão. ― Sou
Pennyweather Van
Syckle-Lockwood. Pode me chamar de Penn. ―
― Entendi, ― Luce
disse, ainda irritada demais para perceber que, em uma vida
passada, ela poderia ter encoberto uma risada por causa
do nome dessa garota.
Soava como se ela tivesse pulado diretamente de um
romance de Dickens. Mas
|
também, havia algo digno de confiança em uma garota com
um nome como esse
que conseguia se apresentar com uma cara séria. ― Sou
Lucinda Price. ―
― E todos te
chamam de Luce, ― Penn disse. ― E você se transferiu da Dover Prep,
em New Hampshire. ―
― Como sabe disso?
― Luce perguntou lentamente.
― Palpite de
sorte? ― Penn deu de ombros. ― Estou brincando, eu li seu arquivo,
dãh. É um passatempo. ―
Luce encarou-a sem expressão. Talvez ela tenha sido
precipitada demais com
aquele julgamento de ser confiável. Como Penn poderia ter
tido acesso ao seu
arquivo?
Penn tomou conta de ligar a água. Quando ficou quente,
ela fez um movimento
para Luce abaixar sua cabeça na pia.
― Veja, o negócio
é que, ― ela explicou, ― eu não sou realmente louca. ― Ela
puxou Luce por sua cabeça molhada. ― Sem ofensa. ― Então
a abaixou de volta. ―
Sou a única nesse colégio sem um mandado de corte. E você
pode achar que não,
mas ser legalmente sã tem suas vantagens. Por exemplo, eu
sou a única em que
confiam para ser ajudante no escritório. O que é idiotice
deles. Tenho acesso a todo
tipo de porcaria confidencial. ―
― Mas se você não tem que
estar aqui– ―
― Quando o seu pai
é o caseiro do colégio, eles meio que tem que deixar você
frequentá-lo de graça. Então... ― Penn dissipou.
O pai de Penn era o caseiro? Pela visão do lugar, não
tinha nem passado pela mente
de Luce que eles ao menos tinham um caseiro.
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― Eu sei o que está pensando, ― Penn
disse, ajudando Luce a limpar o fim de
molho de carne de seu cabelo. ― Que o lugar não é
exatamente bem mantido? ―
― Não, ― Luce
mentiu. Ela estava ansiosa a ficar de bem com essa garota, e queria
mandar vibrações de seja-minha-amiga muito mais do que
queria parecer que
realmente se importava se aparavam a grama da Sword &
Cross frequentemente.
― É, hm, bem bonito. ―
― Papai morreu há
dois anos, ― Penn disse silenciosamente. ― Eles até colocaram
o velho decadente Diretor Udell como meu guardião legal,
mas, hãn, eles nunca
realmente contrataram um substituo para o papai. ―
― Sinto muito, ―
Luce disse, abaixando sua voz, também. Então mais alguém aqui
sabia o que era passar por uma grande perda.
― Tudo bem, ― Penn
disse, espremendo condicionador em sua palma. ― É na
verdade um colégio realmente bom. Eu gosto bastante
daqui. ―
Agora a cabeça de Luce se levantou com tudo, mandando
respingo de água pelo
banheiro. ― Tem certeza de que não é louca? ― ela
provocou.
― Estou brincando.
Odeio aqui. É uma porcaria total. ―
― Mas você não
consegue se forçar a ir embora, ― Luce disse, inclinando sua
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cabeça, curiosa.
Penn mordeu seu lábio. ― Eu sei que é mórbido, mas mesmo
que eu não estivesse
presa ao Udell, eu não conseguiria. Meu pai está aqui. ―
Ela gesticulou na direção
do cemitério, invisível daqui. ― Ele é tudo que eu tenho.
―
― Então suponho
que você tem mais do que outras pessoas nesse colégio, ― Luce
disse, pensando em Arriane. Sua mente voltou para o jeito
como Arriane tinha
agarrado sua mão na quadra hoje, o olhar ansioso em seus
olhos azuis quando ela
fez Luce prometer que iria passar no seu quarto no
dormitório hoje à noite.
― Ela vai ficar
bem, ― Penn disse. ― Não seria segunda-feira se Arriane não fosse
carregada para a enfermaria após um ataque. ―
― Mas não foi um
ataque, ― Luce disse. ― Foi aquela pulseira. Eu a vi. Estava
dando choques nela. ―
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― Nós temos
uma definição muito ampla do que caracteriza um ‘ataque’ aqui
na Sword & Cross. Sua nova inimiga, Molly? Ela já deu
ataques legendários. Eles
ficam dizendoi que vão mudar a medicação dela. Com sorte
você terá o prazer de
testemunhar pelo menos um bom surto antes que ele mudem.
―
A inteligência de Penn era bastante notável. Passou pela
cabeça de Luce perguntar
qual era a história do Daniel, mas a complicada
intensidade de seu interesse nele
era provavelmente melhor mantida a uma base de
necessidade. Pelo menos até
que ela mesmo conseguisse entender.
Ela sentiu as mãos de Penn torcendo água de seu cabelo.
― Essa foi a
última, ― Penn disse. ― Acho que você está finalmente livre de carne.
―
Luce olhou para o espelho e correu suas mãos por seu
cabelo. Penn estava certa.
Exceto pela cicatriz emocional e a dor em seu pé direito,
não havia evidência de seu
rolo na lanchonete com Molly.
― Só fico feliz
por você ter cabelo curto, ― Penn disse. ― Se ainda fosse comprido
como era na foto no seu arquivo, essa teria sido uma
operação bem mais comprida.
―
Luce olhou embasbacada para ela. ― Vou ter que ficar de
olho em você, não vou? ―
Penn enlaçou seu braço no de Luce e guiou-a para fora do
banheiro. ― Só fique de
bem comigo e ninguém se machucará. ―
Luce mandou a Penn um olhar preocupado, mas o rosto de
Penn não demonstrava
nada. ― Você está brincando, certo? ― Luce perguntou.
Penn sorriu, repentinamente feliz. ― Vamos, temos que ir
para aula. Não está feliz
por termos o mesmo horário de tarde? ―
Luce riu. ― Quando você vai parar de saber tudo sobre
mim? ―
― Não no futuro
próximo, ― Penn disse, empurrando-a pelo corredor e de volta na
direção das salas de aula de bloco de cimento. ― Você
logo aprenderá a amar isso,
eu prometo. Sou uma amiga muito poderosa a se ter.
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