Eu me sinto um idiota – disse Tristan, dando uma
olhada no salão de festas da associação de ex– alunos da
|
faculdade pelo vidro da porta da cozinha. A equipe do
bufê estava acendendo os candelabros e verificando as
|
taças de cristal. Na imensa cozinha em
que ele e Gary esperavam, havia várias mesas postas com
fr utas bem
|
lavadas e diferentes tipos de entradas. Tristan não
fazia a mínima idéia do que eram feitas aquelas entradas e se
|
tinham de ser
servidas de alguma
forma especial. Tudo
o que pedia
era simplesmente que
suas taças de
|
champanhe não caíssem da bandeja.
|
Gary não estava conseguindo colocar as abotoaduras. A
faixa do seu
|
smoking
|
alugado não parava de cair, pois
|
o velcro não estava funcionando direito. Um dos seus sapatos pretos e engraxados, um número menor que o
|
dele,
estava amarrado com
cadarço roxo improvisado. Gary
era um amigo
de verdade, pensou
Tristan, por
|
concordar com aquela situação.
|
— Lembre– se, a grana é boa – disse Tristan. — E nós
vamos precisar dela para a próxima competição de
|
natação.
|
— É, se sobrar algum dinheiro depois de a gente pagar
pelo prejuízo – reclamou Gary.
|
— Vai sobrar tudo – respondeu Tristan com confiança. Será que era muito equilibrar
uma bandeja por aí?
|
Ele e Gary eram nadadores. O seu equilíbrio atlético
natural foi responsável pelas mentiras sobre sua experiência
|
como garçom durante a entrevista no bufê. Tinha sido
muito fácil conseguir esse trabalho.
|
Tristan pegou uma bandeja de prata e a usou como espelho.
|
— Não pareço um idiota. Estou com cara de idiota.
|
— Você é um idiota – disse Gary. — E é bom ir logo
sabendo que não sou tão tonto para acreditar nessa sua
|
historinha de conseguir dinheiro para a próxima
competição de natação.
|
— Do que você está falando?
|
Gary pegou um espanador e colocou na cabeça de forma
que as suas fibras parecessem cabelos.
|
— Oh, Tristy — disse com a voz em falsete. — Que
surpresa encontrá– lo no casamento da minha mãe!
|
— Cale a boca, Gary.
|
— Oh, Tristy, deixa essa bandeja para lá e vem dançar
comigo — Gary sorriu passando a mão nos cabelos de
|
espanador.
|
— O cabelo dela não é assim.
|
— Oh, Tristy, acabei de pegar o buquê da minha mãe.
Vamos fugir e nos casar.
|
— Eu não quero casar com ela! Só quero que ela saiba
que eu existo. Só quero sair com ela. Só uma vez! E se
|
ela não gostar de mim, então...
|
Tristan deu de ombros como se não tivesse a mínima
importância, como se a maior paixão que já sentira na
|
vida pudesse simplesmente desaparecer do dia para a
noite.
|
— Oh, Tristy, eu vou chutar o seu...
|
A porta da
cozinha se abriu. — Cavalheiros –
disse monsieur Pompideau. – os
convidados já chegaram e
|
estão
prontos para serem
servidos. Que sorte
a nossa contarmos
com a presença
de dois garçons
tão
|
experientes, disponíveis justamente para nos auxiliar
hoje!
|
— Ele está sendo sarcástico? – perguntou Gary.
|
Tristan revirou os olhos e eles apressaram– se em ir
atrás dos outros garçons, que já se posicionavam em suas
|
bases.
|
Nos primeiros dez
minutos, Tristan
preocupou– se em
observar os outros garçons
trabalhando, tentando
|
aprender a sua função. Sabia que garotas e mulheres
gostavam de um sorriso, e fazia uso disso, especialmente
|
quando o caviar que estava servindo saiu voando, como
se fosse um peixe bem desenvolvido, indo parar bem
|
no colo de uma senhora.
|
Perambulou
pelo imenso salão
de festas, procurando
por Ivy, sempre
olhando enquanto os
homens de
|
mas ele nem tomou conhecimento. Seu pensamento estava
focado em Ivy. E se ficasse cara a cara com ela, o
|
que iria dizer? Aceita um croquete de caranguejo? Ou
talvez: Posso sugerir um
|
Le ballé de Crabe
|
.
|
Sim, isso iria impressioná– la.
|
Que tipo de pessoa ele tinha se tornado. Porque ele,
Tristan Carruthers, um cara cujo rosto estava pendurado
|
nos armários de centenas de garotas (tudo bem, talvez
estivesse exagerando um pouco) precisava impressioná–
|
la. Uma garota que não tinha interesse em ter a foto
dele, nem a de mais ninguém, colada em seu armário, pelo
|
que ele podia perceber. Ela passava pelos mesmos
corredores que ele, mas era como se vivesse em um mundo
|
totalmente diferente.
|
Tinha prestado atenção nela no primeiro dia em que ela
chegou em Stonehill. Não era só a sua beleza exótica,
|
os seus louros
cabelos encaracolados, e
os seus olhos
verdes como o
mar que faziam
com que ele
não
|
conseguisse
parar de olhar, desejando tocá–
la. Era a
maneira como ela
parecia desprendida das
coisas que
|
interessavam às demais pessoas — a maneira como
prestava atenção na pessoa com quem estava conversando,
|
sem ficar olhando para o lado para ver se tinha mais
alguém por ali; a maneira como se vestia diferente de todo
|
mundo; a maneira
como se entregava
a uma canção.
Um dia, ficou
parado na porta
da sala de
música,
|
maravilhado. É claro que ela nem percebeu sua
presença.
|
Duvidava
que Ivy soubesse que ele
existia. Mas será que
trabalhar como garçom seria
realmente uma boa
|
maneira de fazer com que ela finalmente o notasse?
Depois de resgatar um croquete de
caranguejo que tinha
|
saltado de sua
bandeja e ido parar
no meio de
dois sapatos scarpin
de um convidado,
começava a ter suas
|
dúvidas.
|
Foi então que ele a viu. Estava de cor– de– rosa –
muito cor– de– rosa: e tinha uma espécie de glitter cor–
|
de– rosa que não parava de cair dos seus ombros. .
|
Gary
passou perto dele.
Tristan virou– se
rápido demais e
eles deram uma
cotovelada. Oito copos
|
chacoalharam na bandeja, derrubando vinho tinto.
|
— Que vestido! – disse Gary abafando o riso.
|
Tristan deu de ombros. Sabia que o vestido era brega,
mas não estava nem aí. – Ela vai acabar tirando.
|
— Amigão, você está bem ousado, hein?
|
— Não foi isso que eu quis dizer. O que eu...
|
— Pompideau – avisou Gary e os dois dispersaram– se
rapidamente. Entretanto, o
|
maître
|
pegou Tristan pelo
|
braço e o levou
para a cozinha. Quando Tristan voltou,
tinha nas mãos uma bandeja cheia de legumes
e um
|
potinho de patê – coisas que não derramavam. Percebeu
que alguns dos convidados pareciam reconhecê– lo e,
|
rapidamente, desviavam– se de seu caminho quando se
aproximava. O que significava que estava com a bandeja
|
sempre cheia para lá e para cá, mal precisava olhar
para onde estava indo, e tinha tempo suficiente para prestar
|
atenção na festa.
|
— Ei, ssssenhor nadador. Ssssenhor nadador.
|
Era alguém da escola
que estava chamando por ele,
provavelmente alguns dos amigos de
Gregory. Tristan
|
nunca gostou das garotas e rapazes que andavam com
Gregory. Todos tinham dinheiro e se gabavam por isso.
|
Faziam coisas realmente estúpidas e estavam sempre
procurando novas emoções.
|
— Nadador,
nadador, você é ssssurdo? – chamou
o rapaz. Eric Ghent, rosto comprido e cabelos louros,
|
encostado na parede, segurando um castiçal.
|
— Desculpe – disse Tristan. – Você está falando
comigo?
|
— Eu conheço você, Demolidor. Eu conheço você. É isso
que você faz quando não está nadando? – Eric
|
soltou o castiçal e cambaleou.
|
— É isso que eu faço para poder ter dinheiro para
nadar – respondeu Tristan.
|
— Ótimo. Vou te ajudar a conseguir maisssss dinheiro
para nadar.
|
— Como?
|
— Vou fazer com que você não desperdice mais o seu
tempo, Demolidor, vou te dar uma grana para você
|
pegar uma bebida para mim.
|
— Eu acho que você já tomou uma bebida – Tristan olhou
para Eric de cima a baixo.
|
Eric fez que ia dar um soco nele, mas depois deixou
para lá.
|
— Na verdade, você já tomou quatro bebidas — Tristan
se corrigiu.
|
— Esta é uma festa particular. Menores de idade podem
beber. Festa particular ou não, vão sssservir
o que
|
quer que seja, a quem quer que o velho Baines queira
que seja sssservido. Ele compra todo mundo, sabia?
|
Gregory havia aprendido com o pai, pensou Tristan. —
Então, tá – disse em voz alta. — O bar é logo ali –
|
tentou ir embora, mas Eric se colocou bem na frente
dele. — O problema é que eles não me deixam beber mais.
|
Tristan respirou fundo. — Eu preciso beber, Demolidor.
E você precisa de grana.
|
— Eu não aceito gorjetas – disse Tristan.
|
Ele
começou a rir.
— Bem, talvez
você não tenha
conseguido nenhuma. Já
percebi como está
todo
|
desajeitado para lá e para cá. Mas acho que sssssssse
te oferecessem, você pegaria.
|
— Sinto muito.
|
— Nós precisamos um do outro. Nós temos uma escolha.
Podemos ajudar um ao outro ou machucar um ao
|
outro – disse Eric.
|
Tristan não respondeu.
|
— Entende o que eu quero dizer, Demolidor?
|
— Eu entendo o que você quer dizer, mas não posso
ajudá– lo.
|
Eric deu um passo para frente. Tristan deu um passo
para trás. Eric deu outro passo à frente.
|
Tristan ficou tenso. O amigo de Gregory era peso– pena
perto dele. Tinham a mesma altura, mas ele não era
|
nem de longe do mesmo tamanho que Tristan. Mesmo
assim, o cara estava bêbado e não tinha nada a perder –
|
nada como uma bandeja cheia de legumes.
|
Tudo bem, pensou Tristan. Se tirasse o corpo
rapidamente, Eric cairia de joelhos e daria com a cara no chão.
|
Mas
Tristan não havia
contado com um
dos noivos passando
por ali na
mesma hora. Ao
ver que se
|
aproximavam, pelo canto do olho, teve repentinamente
de mudar de direção. Acabou esbarrando em Eric, que
|
estava embriagado. Aipo e couve– flor, cogumelos e pimentões, brócolis e
vagens foram arremessados para o
|
lustre, e acabaram caindo em cima dos noivos.
|
E foi aí que ela olhou para ele. Ivy, a garota do
glitter. Na mesma hora em que seus olhos se encontraram. Ela
|
virou seus olhos
redondos como tomate cereja para
a direção de sua mãe. Tristan
tinha certeza de
que ela
|
finalmente sabia da sua existência. Ele tinha também
plena certeza de que ela nunca sairia com ele. Jamais.
|
— Talvez você
esteja certa, Ivy – sussurrou
Suzanne enquanto olhavam os legumes
crus espalhados pelo
|
salão. – Fora da água, Tristan é bem desajeitado.
|
O que ele estaria fazendo ali? – Ivy perguntou a si
mesma. Por que não ficara na piscina, que era o seu lugar?
|
Sabia que suas
amigas ficariam totalmente
convencidas de que
ele a estava
seguindo, e isso
a deixava
|
envergonhada.
|
Beth foi atrás delas, pisando em um tomate com seu
salto alto. – Talvez seja assim que ele ganhe dinheiro —
|
disse Beth, interpretando o rosto confuso de Ivy.
|
— Jogando brócolis na noiva? — Suzanne balançou a
cabeça negativamente.
|
— Aquele nadador lindinho está com ele também –
continuou Beth. O seu cabelo tingido estava todo para
|
cima, fazendo com que parecesse ainda mais com uma
corujinha fofinha.
|
— Nenhum dos dois tem a mínima ideia da função de
garçom – Suzanne percebeu. – Estão fazendo um bico
|
– Ivy suspirou.
|
— Acho que Tristan está duro – disse Beth.
|
— Você está falando de dinheiro ou de amor por Ivy? –
perguntou Suzanne, e as duas riram.
|
— Ah, dá um tempo, Ivy – disse Beth tocando suavemente
em seus braços.
|
— É engraçado. Aposto que os olhos dele ficaram
arregalados quando viu seu vestido – Suzanne arregalou
|
os olhos e começou a cantarolar a música tema de
|
E o vento levou.
|
Ivy riu. Sabia
que parecia uma Scarlett O‘Hara
coberta por glitter. Mas era o
vestido que a sua mãe tinha
|
escolhido especialmente para ela.
|
Suzanne não parava de cantarolar.
|
— Aposto que os olhos do Gregory se arregalaram quando
ele viu o que você não está usando – disse Ivy à
|
amiga, esperando que, assim, ela calasse a boca.
Suzanne estava usando um vestido preto, decotado, superjusto.
|
— Eu espero que sim.
|
— E
falando no diabo...
– disse Beth. –
Finalmente te achei, Ivy – o tom
de Gregory era quase íntimo.
|
Suzanne virou– se para ele, que pegou no braço de Ivy.
– Nossa presença é aguardada na mesa principal.
|
De braços dados, Ivy seguiu com ele, desejando que
fosse Suzanne em seu lugar.
Sua mãe viu os
dois se
|
aproximarem, sorrindo para Ivy e seu vestido, que mais
parecia um merengue de framboesa.
|
— Obrigada – disse Ivy quando Gregory puxou a cadeira
para que se sentasse.
|
Ele sorriu para ela – o mesmo tipo de sorriso secreto
que tinha visto pela primeira vez em uma competição
|
de natação – ,
inclinou– se, seu lábios
ficaram muito próximos
do seu pescoço e disse: – O prazer
é meu,
|
madame.
|
Ivy sentiu sua
pele arrepiar– se.
Ele está fazendo
joguinho, disse a
si mesma. Jogue
com ele. Desde
a
|
competição de natação, sempre a provocava e tentava
ser amigo dela, e sabia que deveria dar a ele algum crédito
|
Ela tinha entendido completamente sua postura fria
quando chegou na escola. Sabia que deveria ter sido um
|
terrível choque quando ele descobriu que Maggie estava
se mudando com sua prole do apartamento de Norwalk
|
para um que se pai havia alugado em Stonehill, e
estava fazendo isso para iniciar os preparativos do casamento.
|
O romance de Andrew e Maggie começara há muitos anos.
Mas romances eram romances, diziam as pessoas,
|
e Andrew e sua
mãe faziam um par
romântico muito estranho – o
presidente muito rico e
distinto de uma
|
faculdade e sua esposa cabeleireira. Quem iria
imaginar que, anos depois do caso de amor deles, anos depois de
|
Andrew ter se divorciado, ele e Maggie iriam
oficializar o casamento?
|
Tinha sido um
choque para Ivy. Seu pai havia morrido quando
ela era criança. Ela havia crescido vendo a
|
mãe ter um namorado atrás do outro, e pensou que seria
sempre assim.
|
Ivy inclinou– se na mesa para dar uma olhada na mãe.
Andrew olhou para ela e sorriu, em seguida deu uma
|
cotovelada de leve em sua nova esposa. Maggie sorriu
para Ivy. Ela estava tão feliz. Anjo do Amor, rezou Ivy
|
silenciosamente, proteja a mamãe. Proteja a todos nós.
Faça de nós uma família forte e amorosa.
|
— Será que eu preciso dizer que o seu glitter está
caindo na sopa?
|
Ivy voltou– se para trás. Gregory sorriu e ofereceu um
guardanapo a ela.
|
— Esse vestido ainda pode te meter em encrencas –
provocou. – Quase deixou Tristan Carruthers cego.
|
Ivy
percebeu que estava corando. Ela queria mostrar para
o Gregory que
a culpa era do
Eric, e não... –
|
Coitadas das pessoas que serão servidas por ele hoje à
noite. Ele e aquele outro atleta – disse Gregory, sorrindo.
|
– Espero que não sejamos nós.
|
Os dois deram uma olhada pelo salão.
|
Eu também, pensou Ivy, eu também.
|
Um pouco depois da chuva de legumes, o
|
maître
|
disse a Tristan que podia ir embora, e seria melhor
que saísse
|
de lá imediatamente. Cansado e humilhado, teria
adorado partir, mas tinha prometido dar uma carona para Gary.
|
Então, ficou perambulando pela cozinha até encontrar
um depósito em que pudesse se esconder.
|
Estava escuro e tranqüilo por lá, as prateleiras
estavam cheias de caixas e enlatados. Tristan tinha acabado de
|
se
acomodar em uma caixa de
papelão quando ouviu um ruído atrás
dele. Ratos, pensou, ou ratazanas. Não
|
estava nem aí. Tentou consolar– se, imaginando– se no
alto de um pódio, ganhando o primeiro lugar, a bandeira
|
dos Estados
Unidos sendo hasteada ao som do hino nacional, e Ivy assistindo a tudo
pela TV, triste por ter
|
perdido a chance de ter saído com ele um dia.
|
— Sou um idiota – disse, segurando a cabeça com as
mãos.
|
— Poderia ter qualquer garota que quisesse e...
|
Sentiu uma mão encostar suavemente em seu ombro.
|
Tristan olhou
para cima e viu
um garoto pálido, de
rosto triangular. O garoto,
que parecia ter oito anos,
|
estava todo arrumado, o nó da gravata bem feito, e o
cabelo todo cheio de gel. Devia ser um dos convidados do
|
casamento.
|
— O que você está fazendo aqui? – Tristan quis saber.
|
— Será que você conseguiria arrumar um pouco de comida
para mim? – perguntou o garoto.
|
Tristan franziu a testa, irritado por ter de dividir
seu esconderijo, um lugar aconchegante para ficar chorando
|
as mágoas por causa de Ivy – Por que você mesmo não
pega a sua comida?
|
— Eles vão me ver disse o garoto – disse o garoto.
|
— Mas eles também vão me ver!
|
O garoto fez uma cara de desapontamento. Seus olhos
mostravam insegurança e havia um ruga no meio das
|
suas sobrancelhas.
|
Tristan usou um tom mais gentil. — Parece que eu e
você estamos na mesma situação. Nos escondendo.
|
— Estou com muita fome. Não tomei café da manhã e nem
almocei – disse o garoto.
|
Pela fresta da porta, Tristan via os outros garçons
entrando e saindo. O jantar começava a ser servido.
|
— Pode ser que tenha algo no meu bolso – disse ao
garoto, tirando do bolso um croquete de caranguejo
|
amassado,
alguns camarões, três
pedaços de aipo
recheados, um punhado
de castanhas e
um alimento não
|
identificado.
|
— Isso aí é sushi? –
perguntou o garoto.
|
— Agora você me pegou. Tudo isso aí caiu no chão e eu
coloquei no meu bolso, e sei lá por onde é que esse
|
casaco andou, pois é alugado.
|
O garoto concordou com a cabeça e ficou examinando as
opções que Tristan havia lhe oferecido. — Gosto
|
de camarão – disse, pegando um finalmente, cuspiu nele
e depois limpou– o com os dedos. Fez isso com cada
|
camarão
que pegou, fez o mesmo
com o croquete de camarão
e o aipo. Tristan
ficou imaginando se ele
iria
|
cuspir em cada pedacinho de castanha. Perguntou– se qual teria sido
o problema daquela criança para
ela ter
|
ficado o dia inteiro sem comer, escondida dentro de um
quarto escuro.
|
— Então – disse Tristan. – Acho que você não deve
gostar muito de casamento, não é?
|
O garoto olhou para ele. Depois, deu uma mordida no
alimento não identificado.
|
— Você tem nome, garoto?
|
— Sim.
|
— O meu nome é Tristan. Qual é o seu?
|
O garoto deixou de lado a entrada não identificada e
partiu para as castanhas. – O que eu queria mesmo era
|
jantar – disse. — Estou com muita fome.
|
Tristan olhou pela fresta. Os garçons entravam e saíam apressadamente
da cozinha. – Há muita gente lá –
|
disse.
|
— Você se meteu em encrencas? — perguntou o garoto.
|
— Uma encrenquinha. Nada sério. E você?
|
— Ainda não – disse o garoto.
|
— Mas você vai se meter?
|
— Assim que me encontrarem.
|
Tristan fez que sim com a cabeça. – Acho que você já
percebeu que não pode ficar aqui para sempre.
|
O garoto semicerrou
os olhos e
começou a examinar
as prateleiras do
quarto escuro, como
se estivesse
|
considerando seriamente ficar por lá.
|
Tristan gentilmente colocou a mão no braço do garoto.
– Qual é o seu problema, amigão? Quer falar sobre
|
isso?
|
— Gostaria mesmo de jantar – disse o garoto.
|
— Está bem, está bem! – disse Tristan, irritado.
|
— E também gostaria de sobremesa.
|
— Você vai comer aquilo que eu conseguir pegar –
repreendeu Tristan.
|
— Tudo bem – respondeu o garoto obedientemente.
|
Tristan suspirou. – Não liga para mim. Estou de mau
humor.
|
— Eu não ligo – disse o garoto suavemente.
|
— Veja, amigão – disse
Tristan. – Só um garçom na
cozinha e um monte de comida. Você vem comigo?
|
Ótimo! Lá vão eles. Invasores, aos seus lugares,
preparar...
|
— Onde está Philip? – perguntou Ivy.
|
Os convidados já estavam no meio do jantar quando ela
percebeu que o seu irmão não estava sentado onde
|
deveria estar. – Vocês viram o Philip? – disse,
levantando– se do seu lugar.
|
Gregory fez com que ela se sentasse de novo. – Eu não
me preocuparia, Ivy. Provavelmente ele está fazendo
|
bagunça por aí.
|
— Mas ele não comeu nada o dia todo.
|
— Sendo assim, ele está na cozinha. – disse Gregory
simplesmente.
|
Gregory não entendia. Seu irmãozinho estava ameaçando
fugir de casa há semanas. Ela tinha tentado explicar
|
a Philip o que estava acontecendo e como seria bom
eles se mudarem para uma casa grande com uma quadra de
|
tênis e vista para o rio, além de terem um irmão mais
velho como Gregory. Ele não acreditou em nada do que
|
ela disse. Na verdade, nem mesmo Ivy acreditava.
|
Ela empurrou a cadeira, rápido demais para que Gregory
pudesse interrompê– la, e correu para a cozinha.
|
— Vai fundo! – disse Tristan. Na caixa que estava no
meio deles havia uma enorme quantidade de comida –
|
filé– mignon grelhado, camarão, vários tipos de
legumes, saladas e pãezinhos de manteiga.
|
— Isso é bom demais! – disse o garoto.
|
— Bom demais? É um banquete‘. – disse Tristan. — Coma!
Vamos precisar ser fortes para conseguir pegar a
|
sobremesa.
|
O garoto deu um sorrisinho que logo desapareceu.
|
— Quem meteu você em encrencas? — o garoto quis saber.
|
Tristan
terminou de mastigar
e disse: — O
|
maître,
|
monsieur
Pompideau. Estava trabalhando
para ele e
|
derramei algumas coisas. Sabe como é, deixei as calças
de algumas pessoas molhadas – o garoto
sorriu de novo,
|
dessa vez o sorriso foi maior.
|
— Você molhou as calças do Sr. Lever?
|
— Deveria ter feito isso? – Tristan perguntou.
|
O garoto fez que sim com a cabeça e seu rosto brilhou
ao imaginar a cena.
|
— Bem, de qualquer forma, Pompideau falou que eu
deveria servir coisas que não derramassem. Imagine só
|
— Sabe o
que teria dito para ele? –
disse o garoto.
A ruga na sua sobrancelha tinha
desaparecido, estava
|
engolindo a comida e falando com a boca cheia. Parecia
muito melhor do que estava há 15 minutos.
|
— Teria dito: Vá servir na sua orelha!
|
— Boa ideia! — disse Tristan, pegando um pedaço de
aipo. – Vá servir na sua orelha, Pompideau!
|
O garoto morreu de rir e Tristan quebrou o aipo ao
meio.
|
— Vá servir na sua outra orelha, Pompideau! – disse o
garoto.
|
Tristan pegou outro pedaço de aipo.
|
— Vá servir no seu cabelo, Diptidu! – gritou o garoto
deixando– se levar pela brincadeira.
|
Tristan
pegou um pouco
de salada e
jogou na cabeça.
Só então percebeu
que a salada
tinha molho de
|
vinagrete.
|
O garoto jogou a cabeça para trás de tanto rir. — Vá
servir no seu nariz, Dubidu!
|
Bem, por que não? — pensou Tristan. Ele já tinha tido
oito anos uma vez, e ainda se lembrava o quanto os
|
garotos gostavam de caretas e melecas de nariz. Pegou
dois camarões e colocou cada um deles na suas narinas,
|
deixando os rabinhos cor– de– rosa de fora.
|
O garoto quase caiu da caixa de tanto rir. — Vá servir
nos seus dentes, Dubidu!
|
Colocou duas azeitonas pretas em cada um dos seus
incisivos. — Vá servir no...
|
Tristan estava tão concentrado arrumando o aipo e os
rabinhos de camarão que não percebeu que a fresta da
|
porta estava maior. Não viu quando o rosto do garoto
se transformou. – Vá servir aonde, Dubidu?
|
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