domingo, 19 de maio de 2013

50 Tons de cinza (Capítulo 3)


Kate está em êxtase.
         — Mas o que ele estava fazendo na Clayton? — Sua curiosidade escoa pelo telefone. Eu estou nas profundezas da sala de estoque, tentando manter minha voz casual.
         — Ele passou por aqui.
         — Eu acho que isto é uma coincidência enorme, Ana. Você não acha que ele estava ai para ver você?
         Ela especula. Meu coração bater forte com a possibilidade, mas a alegria dura pouco. A triste e decepcionante realidade é maçante, ele esteve aqui a negócios.
         — Ele veio visitar a divisão de agricultura da universidade. Ele está financiando algumas pesquisas, — eu murmuro.
         — Oh sim. Ele deu ao departamento uma doação de $2.5 milhões de Grant.[1]
         Uou.
         — Como você sabe disto?
         — Ana, eu sou uma jornalista, e eu escrevi um perfil sobre o cara. É meu trabalho saber disto.
         — Ok, Carla Bernstein,[2] fique fria. Então você quer as fotos?
         — Claro que eu quero. A questão é, quem vai fazê-las e onde.
         — Nós podemos perguntar-lhe onde. Ele disse que vai ficar na área.
         — Você pode contatá-lo?
         — Eu tenho seu número de telefone celular.
         Kate ofega.
         — O mais rico, mais esquivo, mais enigmático solteiro do Estado de Washington, apenas lhe deu seu número de telefone celular.
         — Ah… sim.
         — Ana! Ele gosta de você. Não há dúvida sobre isto. — Seu tom é enfático.
         — Kate, ele está apenas tentando ser agradável. — Mas mesmo quando eu digo as palavras, eu sei que elas não são verdade. 
       — Christian Grey não é agradável.  Ele é educado, talvez. E uma pequena voz sussurra silenciosa, talvez Kate esteja certa.  Fico arrepiada com a ideia de que talvez, apenas talvez, ele possa gostar de mim. Afinal, ele disse que estava contente por Kate não ter feito à entrevista. Eu abraço a mim mesma com uma silenciosa alegria, balançando-me de um lado para outro, acolhendo a possibilidade de que ele possa gostar de mim por um breve momento. Kate me traz de volta para o agora.
         — Eu não sei como vamos conseguir fazer as fotos. Levi, o nosso fotógrafo regular, não pode. Ele foi para casa em Idaho Falls pelo fim de semana. Ele vai ficar puto por perder uma oportunidade para fotografar um dos principais empresários da América.
         — Humm… Que tal José?
         — Grande ideia! Você pergunta a ele, ele faz qualquer coisa por você. Então chame Grey e descubra onde ele nos encontrará. — Kate é irritantemente arrogante sobre José.
         — Eu acho que você deveria chamá-lo.
         — Quem, José?— Kate ridiculariza.
         — Não, Grey.
         —Ana, você é a única que tem um relacionamento.
         — Relacionamento — Eu bufo para ela, minha voz subindo várias oitavas. — Eu mal conheço o cara.
       — Pelo menos você o conheceu, — ela diz amargamente. — E ele parece querer conhecer você melhor. Ana, apenas ligue para ele, — ela estala e desliga. Ela é tão mandona às vezes. Eu faço uma careta para meu celular, mostrando minha língua para ele.
         Eu estou deixando uma mensagem para José, quando Paul entra na sala de estoque procurando por lixas.
         — Nós estamos meio ocupados lá fora, Ana, — ele diz sem animosidade.
         — Sim, hum, desculpe, — eu murmuro, voltando-me para sair.
         — Então, como é que você conheceu Christian Grey? — A voz de Paul tenta se mostrar indiferente, mas é pouco convincente.
         — Eu tive que entrevistá-lo para nosso jornal estudantil. Kate não estava bem. — Eu encolho os ombros, tentando soar casual, mas também sou pouco convincente.  
         — Christian Grey na Clayton. Vá entender, — Paul bufa, pasmo. Ele agita sua cabeça como se para limpá-la. — E então, quer sair para beber ou algo assim hoje à noite?
         Sempre que ele está em casa ele me convida para sair, e eu sempre digo não. É um ritual. Eu nunca considerei uma boa ideia sair com o irmão do chefe, e além disso, Paul é muito atraente como todo jovem americano da casa ao lado, mas ele não é nenhum herói literário, nem esforçando muito  minha imaginação. Grey é?  Meu subconsciente pergunta-me, sua sobrancelha levantada no sentido figurado.
         Eu o esbofeteio.
         — Você não tem um jantar de família ou algo assim com seu irmão?
         — Isto é amanhã.
         — Talvez alguma outra hora, Paul. Eu preciso estudar hoje à noite. Eu tenho meus exames finais na semana que vem.
         — Ana, um dia destes, você dirá sim, — ele sorri quando eu escapo para a loja.
         — Mas eu fotógrafo lugares, Ana, não pessoas, — José geme.
         — José, por favor? — Eu imploro. Segurando meu celular, eu marcho pela sala de estar de nosso apartamento, desviando a vista da janela para a luz noturna desvanecendo.
         — Dê-me o telefone. — Kate agarra o telefone de mim, lançando seu sedoso cabelo, loiro avermelhado acima de seu ombro.
         — Escute aqui, José Rodriguez, se você quiser que nosso jornal cubra a abertura de seu show, você vai fazer estas fotos para nós amanhã, capiche? — Kate pode ser terrivelmente dura.
         — Ótimo. Ana vai ligar de volta informando o local e horário. Nós vemos você amanhã. — Ela fecha meu celular com um estalo.
         — Feito. Tudo que nós precisamos fazer agora é decidir onde e quando. Ligue para ele. — Ela aponta o telefone para mim. Meu estômago revira.
         — Ligue para Grey, agora!
         Eu faço uma careta para ela e alcanço no meu bolso de trás o cartão de negócios dele. Eu tomo uma profunda e firme respiração, e com dedos trêmulos, eu disco o número.
         Ele responde no segundo toque. Sua voz é tranquila e fria.
         — Grey.
         — Haa… Sr. Grey? É Anastásia Steele. — Eu não reconheço minha própria voz, eu estou muito nervosa. Há uma breve pausa. Por dentro eu estou tremendo.
         — Senhorita Steele. Como é bom ouvi-la. — Sua voz muda. Ele fica surpreso, eu acho, e ele soa tão… morno, sedutor até. Minha respiração entala, e eu ruborizo. De repente estou consciente de que Katherine Kavanagh está olhando fixamente para mim, boquiaberta, e eu vou para a cozinha para evitar seu minucioso olhar indesejável.
         — Haa, nós gostaríamos de fazer a sessão de fotos para o artigo. — Respire, Ana, respire. 
         Meus pulmões absorvem uma respiração apressada. — Amanhã, se estiver tudo bem. Onde seria conveniente para você, senhor?
         Eu quase posso ouvir seu sorriso de esfinge pelo telefone.
         — Eu vou estar no Heathman em Portland. Digamos nove e meia, amanhã de manhã?
— Certo, nós veremos você lá. — Eu estou irradiante e sem fôlego, como uma criança, não uma mulher adulta que pode votar e beber legalmente no Estado de Washington.
         — Eu espero ansiosamente por isto, Senhorita Steele. — Eu visualizo o brilho perverso em seus olhos cinza. Como ele consegue fazer com que sete pequenas palavras, garantam tantas promessas tentadoras?  Eu desligo. Kate está na cozinha, e ela está olhando fixamente para mim com um olhar de completa e total consternação em seu rosto.
         — Anastásia Rose Steele. Você gosta dele! Eu nunca vi ou ouvi você tão, tão… afetada por alguém antes. Você está realmente corada.
         — Oh Kate, você sabe que eu ruborizo o tempo todo. É quase uma profissão. Não seja tão ridícula, — eu saio dessa rapidamente. Ela pisca para mim com surpresa, eu raramente fico com raiva, e se fico, rapidamente eu deixo para lá. — Eu apenas o acho… intimidante, isto é todo.
         — Heathman, nada mal, — Kate murmura. — Eu darei um telefonema para o gerente e negociarei um espaço para as fotos.
         — Eu vou fazer o jantar. Depois eu preciso estudar. — Eu não posso esconder minha irritação com ela, quando eu abro um dos armários para fazer o jantar.
         Eu estou inquieta está noite, não paro de me mover e dar voltas e voltas na cama. Sonhando com olhos cinza, macacões, pernas longas, dedos longos, e um local muito escuro e inexplorado. Eu desperto duas vezes na noite, meu coração batendo muito rápido.  Oh, se não conseguir dormir, amanha vou estar com uma cara estupenda, eu me repreendo. Eu esmurro meu travesseiro e tento me ajeitar.
         O Heathman está situado no coração do centro da cidade de Portland. Seu impressionante edifício de pedras marrom foi concluído bem antes da crise da década de 20. José, Travis e eu estamos viajando no meu Fusca, e Kate está em seu CLK, uma vez que não cabemos todos em meu carro. Travis é amigo e gopher[3] de José, e eu estou aqui para ajudar com a iluminação. Kate conseguiu adquirir o uso de um quarto livre de encargos, pela manhã no Heathman, em troca de um crédito no artigo. Quando ela explica na recepção, que estamos aqui para fotografar o CEO Christian Grey, nós somos imediatamente conduzidos para uma suíte. Apenas uma suíte de tamanho regular, no entanto, já que aparentemente o Sr. Grey está ocupando a maior do edifício. Um executivo de marketing muito interessado nos mostra à suíte, ele é extremamente jovem e está muito nervoso por alguma razão.
         Eu suspeito que seja a beleza de Kate e seu ar autoritário que o desarmou, porque ele faz o que ela quer. Os quartos são elegantes, discretos, e opulentamente mobiliado.
         São nove horas. Nós temos meia hora para nos instalar. Kate vai de um lado para o outro.
         — José, eu acho que nós vamos fotografar contra aquela parede, você concorda? — Ela não espera por sua resposta. — Travis, limpe as cadeiras. Ana, você pode pedir ao serviço de quarto para trazer algumas bebidas? E deixe Grey saber onde estamos.
         Sim, Senhora.  Ela é tão dominadora. Eu desvio meu olhar, mas faço o que me é pedido.
         Meia hora mais tarde, Christian Grey entra em nossa suíte.
         Puta merda!  Ele está vestindo uma camisa branca, aberta no colarinho, e calças de flanela cinza que pendem de seus quadris. Seus cabelos incontroláveis ainda estão úmidos do banho. Minha boca fica seca só ao olhar para ele… ele é tão estupidamente quente.  Grey entra na suíte acompanhado de um homem que aparenta ter seus trinta e poucos anos, com um corte militar, com um acentuado terno escuro e gravata, que fica em silencio no canto. Seus olhos cor de avelã nos observa impassível.
         — Senhorita Steele, nos encontramos novamente. — Grey estende a mão, e eu a agito, piscando rapidamente.
         Oh cara… ele realmente é bastante… uau. Quando eu toco em sua mão, eu sinto aquela deliciosa corrente atravessando-me diretamente, iluminando-me, fazendo-me ruborizar, e eu tenho certeza que minha respiração irregular deve ser audível.
         — Sr. Grey, esta é Katherine Kavanagh, — eu murmuro, acenando com uma mão em direção a Kate que avança, olhando-o diretamente nos olhos.
         — A tenaz senhorita Kavanagh. Como vai? — Ele lhe dá um pequeno sorriso, olhando genuinamente divertido. — Eu acredito que você está se sentindo melhor? Anastásia disse que você estava indisposta na semana passada.
         — Eu estou bem, obrigada, Sr. Grey. — Ela agita sua mão com firmeza, sem pestanejar.
         Eu me lembro que Kate esteve nas melhores escolas particulares de Washington. Sua família tem dinheiro, e ela cresceu confiante e segura de seu lugar no mundo. Ela não engole nenhum desaforo. Eu a admiro.
         — Obrigada por ter tempo para fazer isto. — Ela lhe dá um educado, sorriso profissional.
         — É um prazer, — ele responde, voltando seu olhar cinza para mim, e eu ruborizo novamente. Maldição.
         — Este é José Rodriguez, nosso fotógrafo, — eu digo, sorrindo para José, que sorri com carinho de volta para mim. Seus olhos são frios quando ele olha de mim para Grey.
         — Sr. Grey,— ele movimenta a cabeça.
         — Sr. Rodriguez, — A expressão de Grey muda completamente quando ele avalia José.
         — Onde você me quer? — Grey pergunta a ele. Seu tom soa vagamente ameaçador. Mas Katherine não está disposta a deixar José executar um show.
         — Sr. Grey, se você puder se sentar aqui, por favor? Tenha cuidado com os cabos de iluminação. E depois, nós vamos fazer algumas de pé também. — Ela o direciona para uma cadeira instalada contra a parede.
         Travis liga as luzes, momentaneamente ofuscando Grey, e murmura uma desculpa.
         Então, Travis e eu recuamos e assistimos como José passa a tirar fotos. Ele tira várias fotos apoiadas, pedindo para Grey virar-se de um jeito, de outro, mover seu braço, então, abaixá-lo novamente. Movendo o tripé, José tira muitas outras, enquanto Grey se senta e posa, pacientemente e naturalmente por mais ou menos vinte minutos. Meu desejo se realizou: Eu posso ficar aqui de pé e admirar Grey bem de perto. Duas vezes nossos olhos se fitam, e eu tenho que afastar o meu para longe de seu olhar nublado.
         — Já é o suficiente sentando. — Katherine comanda novamente. — De pé, Sr. Grey? — Ela pergunta.
         Ele se levanta, e Travis corre para remover a cadeira. O dispositivo da Nikon de José começa a clicar novamente.
         — Eu acho que temos o suficiente, — José anuncia cinco minutos mais tarde.
         — Ótimo, — diz Kate. — Obrigada novamente, Sr. Grey. — Ela o cumprimento, assim como José.
         — Eu espero ansiosamente ler o artigo, Senhorita Kavanagh, — Grey murmura, e se vira para mim, aguardando à porta. — Você me acompanha, Senhorita Steele? — Ele pergunta.
         — Claro, — eu digo, completamente arrebatada. Eu olho ansiosamente para Kate, que encolhe os ombros para mim. Eu noto que José está carrancudo atrás dela.
         — Bom dia para vocês todos, — diz Grey enquanto ele abre a porta, abrindo caminho para me permitir sair primeiro.
         Que inferno… o que é isto? O que ele quer?  Eu paro no corredor do hotel, remexendo-me nervosamente quando Grey sai do quarto, seguido pelo Senhor “Corte de Recruta” em seu terno acentuado.
         — Eu ligo para você, Taylor, — ele murmura para o “Corte de Recruta”. Taylor caminha pelo corredor abaixo, e Grey vira seu olhar cinzento queimando para mim. Merda… eu fiz algo errado?
         — Gostaria de saber se você se juntaria a mim para o café da manhã.
         Meu coração dispara em minha boca. Um encontro? Christian Grey está me convidando para um encontro. Ele está perguntando se você quer um café. Talvez ele pense que você não acordou ainda, meu subconsciente resmunga para mim em um humor irônico novamente. Eu limpo minha garganta tentando controlar meus nervos.
         — Eu tenho que levar todo mundo para casa, — eu murmuro, me desculpando, torcendo minhas mãos e os dedos na minha frente.
         — TAYLOR, — ele chama, fazendo-me saltar. Taylor, que tinha retrocedido pelo corredor abaixo, se vira e volta em direção a nós.
         — Eles vão para a universidade? — Grey pergunta, sua voz suave e inquiridora. Eu movimento a cabeça, muito atordoada para falar.
         — Taylor pode levá-los. Ele é meu motorista. Nós temos um grande 4x4 aqui, então ele poderá levar o equipamento também.
         — Sr. Grey? — Taylor pergunta quando ele nos alcança, permanecendo distante.
         — Por favor, você pode conduzir o fotógrafo, seu assistente, e a Senhorita Kavanagh para casa?
         — Certamente, senhor, — Taylor responde.
         — Pronto. Agora você pode juntar-se a mim para o café? — Grey sorri como se tivesse concluído um negócio.
         Eu olho feio para ele.
         — Aah, Sr. Grey, é, isto realmente… olhe, Taylor não tem que levá-los para casa. — Eu lanço um breve olhar para Taylor, que permanece estoicamente impassível. — Eu trocarei de veículo com Kate, se você me der um momento.
         Grey sorri deslumbrante, desprotegido, natural, exibindo todos os seus dentes, um sorriso glorioso. Oh meu Deus… e ele abre a porta da suíte para que eu possa entrar. Eu passo ao redor dele para entrar no quarto, encontrando Katherine em uma profunda discussão com José.
         — Ana, eu acho que ele definitivamente gosta de você, — ela diz sem qualquer preâmbulo. José me olha com desaprovação. — Mas eu não confio nele, — ela adiciona. Eu levanto minha mão na esperança de que ela pare de falar. Por algum milagre, ela o faz.
         — Kate, se você levar o fusca, eu posso levar seu carro?
         — Por quê?
         — Christian Grey me convidou para tomar café com ele.
         Ela fica boquiaberta. Kate emudece! Eu saboreio o momento. Ela me agarra pelo braço e me arrasta para o quarto que fica fora da sala de estar da suíte.
         — Ana, há algo sobre ele. — Seu tom é cheio de advertência. — Ele é magnífico, eu concordo, mas eu acho que ele é perigoso. Especialmente para alguém como você.
         — O que você quer dizer, com alguém como eu? — Eu exijo, afrontada.
         — Uma inocente como você, Ana. Você sabe o que eu quero dizer, — ela fala um pouco irritada. Eu ruborizo.
         — Kate, é apenas um café. Eu estou começando meus exames finais esta semana, e eu preciso estudar, então eu não vou demorar muito.
         Ela franze seus lábios como se considerando meu pedido. Finalmente, ela pesca as chaves do carro do bolso e entrega-as para mim. Eu entrego as minhas.
         — Eu vejo você mais tarde. Não demore muito, ou eu vou enviar uma busca e salvamento.
         — Obrigada. — Eu a abraço.
         Eu saio da suíte para encontrar Christian Grey esperando, encostado contra a parede, parecendo com um modelo em uma pose para alguma brilhante revista top de linha.
         — Ok, vamos tomar café, — eu murmuro, ruborizando como uma beterraba vermelha.
         Ele sorri.
         — Depois de você, Senhorita Steele. — Ele se ergue, levantando a mão para que eu vá primeiro.
         Eu faço meu caminho pelo corredor abaixo, meus joelhos trêmulos, meu estômago cheio de borboletas,[4] e meu coração em minha boca, batendo em um ritmo dramático desigual. Eu vou tomar um café com Christian Grey... e eu odeio café.
         Nós caminhamos juntos pelo largo corredor do hotel para os elevadores. O que eu devo dizer a ele?  Minha mente de repente paralisa com apreensão. Sobre o que nós vamos conversar?
         O que na Terra eu tenho em comum com ele? Sua voz suave e morna me surpreende de meu devaneio.
         — Quanto tempo você e Katherine Kavanagh se conhecem?
         Oh, uma pergunta fácil para começar.
         — Desde nosso primeiro ano. Ela é uma boa amiga.
         — Humm, — ele responde, reservado. O que ele está pensando?
         Nos elevadores, ele aperta o botão de chamada, e a campainha toca quase que imediatamente. As portas deslizam abertas, revelando um jovem casal em um amasso apaixonado do lado de dentro. Surpresos e envergonhados, eles se separam, olhando culpados em todas as direções, menos na nossa. Grey e eu entramos no elevador.
         Eu estou lutando para manter uma expressão séria, então eu olho para o chão, sentindo minhas bochechas ficando vermelhas. Quando eu espio para Grey através de meus cílios, ele tem a sugestão de um sorriso em seus lábios, mas é muito difícil de dizer. O jovem casal não diz nada, e nós viajamos até o andar térreo em um silêncio constrangedor. Nós nem sequer temos uma inútil música ambiente para nos distrair.
         As portas abrem e, para minha surpresa, Grey toma minha mão, apertando-a com seus dedos longos e frios. Eu sinto o choque correr por mim, e meus já rápidos batimentos aceleram. Quando ele me leva para fora do elevador, nós podemos ouvir as risadinhas suprimidas do casal que estoura atrás de nós. Grey sorri.
         — O que tem os elevadores? — Ele murmura.
         Nós cruzamos o extenso saguão movimentado do hotel, em direção à entrada, mas, Grey evita a porta giratória e, eu me pergunto se isto é porque ele teria que largar minha mão.
         Do lado de fora, está um ameno domingo de maio. O sol está brilhando e o tráfico está limpo. Grey vira à esquerda e anda até a esquina, onde nós paramos, esperando pelas luzes de pedestres do cruzamento mudar. Ele ainda está segurando minha mão. Eu estou na rua, e Christian Grey está segurando minha mão.  Ninguém jamais segurou minha mão. Eu me sinto tonta, e eu estou formigando por toda parte. Eu tento sufocar o ridículo sorriso que ameaça repartir meu rosto em dois. Tente ficar fria, Ana, meu subconsciente implora. O homem verde aparece, e nós andamos novamente.
         Nós caminhamos quatro quarteirões, antes de alcançarmos a Cafeteria de Portland, onde Grey me libera para segurar a porta aberta, para que eu possa entrar.
         — Por que você não escolhe uma mesa, enquanto eu pego as bebidas. O que você gostaria? — Ele pergunta, cortês como sempre.
         — Eu quero… um, English Breakfast tea,[5] em saquinho.
         Ele levanta suas sobrancelhas.
         — Café não?
         — Eu não gosto de café.
         Ele sorri.
         — Ok, chá em saquinho. Açúcar?[6]
         Por um momento, eu fico atordoada, pensando que está me chamando carinhosamente, mas felizmente meu subconsciente entra em ação com lábios franzidos. Não, estúpida, se você quer açúcar?
         — Não obrigada. — Eu olho para baixo para meus dedos atados.
         — Alguma coisa para comer?
         — Não obrigada. — Eu sacudo minha cabeça, e ele anda para o balcão.
         Eu disfarçadamente olho para ele sob meus cílios, enquanto ele está na fila de espera para ser servido. Eu poderia observá-lo o dia todo… ele é alto, de ombros largos, esbelto e a forma como suas calças pendem de seus quadris… Oh meu Deus.  Algumas vezes ele corre seus longos e graciosos dedos por seus agora, cabelos secos, mas ainda desordenado. Humm… eu gostaria de fazer isto.  O pensamento vem espontaneamente em minha mente, e meu rosto incendeia. Eu mordo meu lábio e olho para minhas mãos novamente, não gostando para onde meus pensamentos rebeldes estão se dirigindo.
         — Um centavo por seus pensamentos? — Grey está de volta, assustando-me.
         Eu fico roxa. Eu estava apenas pensando em correr meus dedos por seus cabelos e perguntando-me se pareceria suave ao toque.  Eu balanço minha cabeça. Ele está carregando uma bandeja, que ele coloca sobre a pequena mesa redonda de carvalho envernizada. Ele me entrega uma xícara e um pires, um pequeno bule, e um pratinho contendo um solitário saquinho de chá impresso “Twinings English Breakfast”, meu favorito. Ele carrega um café que ostenta um maravilhoso padrão de folhas impresso no leite. Como eles fazem isto?  Eu me pergunto à toa. Ele também comprou um bolinho de mirtilo para si mesmo. Pondo de lado a bandeja, ele se senta do meu lado oposto e cruza suas longas pernas. Ele parece tão confortável, tão à vontade com seu corpo, eu o invejo. E aqui estou eu, toda desengonçada e descoordenada, incapaz de conseguir ir de A até B sem cair de cara no chão.
         — Seus pensamentos? — Ele solicita.
         — Este é meu chá favorito. — Minha voz é calma, ofegante. Eu simplesmente não posso acreditar que eu estou sentada em frente a Christian Grey, em uma cafeteria em Portland. Ele franze a testa. Ele sabe que eu estou escondendo algo. Eu coloco o saquinho de chá no bule e quase que imediatamente o pesco novamente com minha colher de chá. Quando eu coloco o saquinho usado de volta no pratinho, ele dobra sua cabeça olhando pra mim interrogativamente.
         — Eu gosto de meu chá preto e fraco, — eu murmuro como uma explicação.
         — Entendo. Ele é seu namorado?
         Uou… O que? 
         — Quem?
         — O fotógrafo. José Rodriguez.
         Eu rio nervosa, mas curiosa. O que deu a ele aquela impressão?
         — Não. José é um bom amigo, apenas isto. Por que você pensou que ele fosse meu namorado?
         — O modo como você sorriu para ele, e ele para você. — Seu olhar cinza mantém o meu. Ele é tão enervante. Eu quero desviar o olhar, mas eu estou presa, encantada.
         — Ele é mais como da família, — eu sussurro.
         Grey acena ligeiramente com a cabeça, aparentemente satisfeito com a minha resposta, e eu olho para baixo para seu bolinho de mirtilo. Seus longos dedos habilmente descascam o papel, e eu assisto fascinada.
         — Você quer um? — Ele pergunta, e aquele secreto sorriso divertido, está de volta.
         — Não obrigada. — Eu franzo a testa e olho para baixo, para minhas mãos novamente.
         — E o garoto que eu conheci ontem na loja. Ele não é seu namorado?
         — Não. Paul é apenas um amigo. Eu disse a você ontem. — Oh, isto está ficando ridículo. — Por que você pergunta?
  — Você parece ficar nervosa ao redor dos homens.
         Puta merda, isto é pessoal. Eu fico nervosa apenas ao seu redor, Grey.
         — Eu acho você intimidante. — Eu fico escarlate, mas mentalmente eu dou tapinhas em minhas costas pela minha franqueza, e olho para minhas mãos novamente. Eu ouço seu profundo suspiro.
         — Você deve me achar intimidante, — ele acena concordando. — Você é muito honesta. Por favor, não olhe para baixo. Eu gosto de ver seu rosto.
         Oh. Eu olho para ele, e ele me dá um sorriso encorajador, mas irônico.
         — Isto me dá algum tipo de pista do que você pode estar pensando, — ele inspira. — Você é um mistério, Senhorita Steele.
         Misteriosa? Eu?
         — Não existe nada misterioso em mim.
         — Eu penso que você é muito auto-suficiente, — ele murmura.
         Eu sou? Uau… como vou administrar isto?  Isto é desconcertante. Eu, auto-suficiente?
       De jeito nenhum.
         — Exceto quando você ruboriza, claro, o que acontece frequentemente. Eu só gostaria de saber por que você estava corada. — Ele joga um pequeno pedaço de bolinho em sua boca, e começa a mastigá-lo lentamente, sem tirar seus olhos de mim. Como se fosse uma sugestão, e eu ruborizo. Merda!
         — Você sempre faz este tipo de observações pessoais?
         — Eu não percebi que fosse. Eu ofendi você? — Ele parece surpreso.
         — Não, — eu respondo honestamente.
         — Bom.
         — Mas você é muito arrogante, — eu retalio calmamente.
         Ele levanta as sobrancelhas e, se não me engano, ele ruboriza ligeiramente também.
         — Eu estou acostumado a fazer as coisas do meu jeito, Anastásia, — ele murmura. — Com todas as coisas.
         — Eu não duvido disso. Por que você não me pediu para chamá-lo por seu primeiro nome? — Eu fico surpresa por minha audácia. Por que esta conversa se tornou tão séria? Isto não está indo do modo como eu pensei que fosse. Eu não posso acreditar que eu estou me sentindo tão antagônica com ele.
         É como se ele estivesse tentando me advertir.
         — As únicas pessoas que usam meu nome de batismo são a minha família e alguns amigos íntimos. Este é o modo que eu gosto.
         Oh. Ele ainda não disse, “Chame-me Christian”. Ele é um maníaco por controle, não existe nenhuma outra explicação, e parte de mim está pensando que, talvez, teria sido melhor se Kate o entrevistasse. Dois maníacos por controle, juntos. Mais claro que ela é quase loira, loira morango, como todas as mulheres em seu escritório.  E ela é bonita, meu subconsciente me lembra. Eu não gosto da ideia de Christian e Kate. Eu tomo um gole de meu chá, e Grey come outro pequeno pedaço de seu bolinho.
         — Você é filha única? — Ele pergunta.
         Uou… ele continua a mudar de direção.
         — Sim.
         — Fale-me sobre seus pais.
         Por que ele quer saber disto? É tão enfadonho.
         — Minha mãe vive na Geórgia com seu novo marido Bob. Meu padrasto vive em Montesano.
         — Seu pai?
         — Meu pai morreu quando eu era um bebê.
         — Eu sinto muito, — ele murmura e um incomodado olhar fugaz, atravessa seu rosto.
         — Eu não me lembro dele.
         — E sua mãe se casou de novo?
         Eu bufo.
         — Você pode dizer isto.
         Ele franze a testa para mim.
         — Você não está indo muito longe, não é? — Ele diz secamente, coçando seu queixo, como se estivesse pensamento profundamente.
         — Nem você.
         — Você já me entrevistou uma vez, e eu me lembro de algumas questões bastante comprometedoras. — Ele sorri afetuosamente para mim.
         Puta merda.  Ele está lembrando a pergunta do “gay”. Mais uma vez, eu fico mortificada. Daqui a anos, eu sei, vou precisar de terapia intensiva para não sentir vergonha toda vez que eu recordar este momento. Eu começo a murmurar sobre minha mãe, qualquer coisa para bloquear esta memória.
         — Minha mãe é maravilhosa. Ela é uma romântica incurável. Ela atualmente está casada com seu quarto marido.
          Christian levanta as sobrancelhas em surpresa.
         — Eu sinto falta dela, — eu continuo. — Ela tem Bob agora. Eu só espero que ele possa vigiá-la e juntar os pedaços, quando seus esquemas desmiolados não saírem como planejado. — Eu ternamente sorrio. Eu não vejo minha mãe por um longo tempo. Christian observa-me atentamente, tomando goles ocasionais de seu café. Eu realmente não devia olhar para sua boca. É inquietante. Aqueles lábios.
         — Você se entende com seu padrasto?
         — Claro. Eu cresci com ele. Ele é o único pai que eu conheci.
         — E como ele é?
         — Ray? Ele é… reservado.
         — Só isto? — Grey pergunta, surpreso.
         Eu encolho os ombros. O que este homem espera? A história da minha vida?
         — Reservado como sua enteada, — Grey sugere de imediato.
         Eu me abstenho afastando meu olhar dele.
         — Ele gosta de futebol, especialmente futebol europeu, e de boliche, e pesca com mosca, e fazer móveis. Ele é um carpinteiro. Ex- fuzileiro. — Eu suspiro.
         — Você viveu com ele?
         — Sim. Minha mãe encontrou o Terceiro Marido, quando eu tinha quinze anos. Eu fiquei com Ray.
         Ele franze a testa como se não entendesse.
         — Você não quis viver com sua mãe? — Ele pergunta.
         Eu ruborizo. Isto não é realmente de sua conta.
         — Terceiro Marido vivia no Texas. Minha casa estava em Montesano. E você sabe... minha mãe era recém- casada. — Eu paro. Minha mãe nunca falou sobre o ser terceiro marido. Onde Grey está querendo ir com isso? Isto não é de sua conta. Dois podem jogar este jogo.
         — Fale-me sobre seus pais, — eu pergunto.
         Ele encolhe os ombros.
         — Meu papai é um advogado, minha mãe é pediatra. Eles vivem em Seattle.
         Oh… ele teve uma educação cara. E eu me pergunto sobre um casal bem sucedido que adota três crianças, e uma delas se transforma em um belo homem que assume o mundo dos negócios e o conquista sozinho. O que o levou a ser deste modo? Seus pais devem estar orgulhosos.
         — O que seus irmãos fazem?
         — Elliot está na construção, e minha irmã mais nova está em Paris, estudando arte culinária com algum renomado chefe de cozinha francês. — Seus olhos nublam com irritação. Ele não quer falar sobre sua família ou ele mesmo.
         — Eu ouvi dizer que Paris é adorável, — eu murmuro. Por que ele não quer conversar sobre sua família? É porque ele é adotado?
         — É bonita. Você já esteve lá? — Ele pergunta, sua irritação esquecida.
         — Eu nunca deixei o continente dos EUA. — Então, agora nós voltamos para banalidades. O que ele está escondendo?
         — Você gostaria de ir?
         — Para Paris? — Eu bufo. Isto me desequilibra, quem não gostaria de ir para Paris? — É claro, — eu concedo. — Mas é a Inglaterra que eu realmente gostaria de visitar.
         Ele dobra sua cabeça para um lado, correndo seu dedo indicador por seu lábio inferior… oh meu.
         — Por quê?
         Eu pisco rapidamente. Concentre-se, Steele.
         — É a casa de Shakespeare, Austen, as irmãs de Brontë, Thomas Hardy. Eu gostaria de ver os lugares que inspiraram estas pessoas a escrever livros tão maravilhosos.
         Toda esta conversa de grandes nomes literários, faz-me lembrar de que eu devia estar estudando. Eu olhar para meu relógio.
         — É melhor eu ir. Eu tenho que estudar.
         — Para seus exames?
         — Sim. Eles começam na terça-feira.
         — Onde está o carro da senhorita Kavanagh?
         — No estacionamento do hotel.
         — Eu vou levá-la de volta.
         — Obrigado pelo chá, Sr. Grey.
         Ele sorri com seu estranho sorriso “eu tenho um grande segredo”.
         — Você é bem-vinda, Anastásia. O prazer é todo meu. Venha, — ele comanda, e segura minha mão com a sua. Eu seguro-a, confusa, e o sigo para fora da cafeteria.
         Nós andamos de volta para o hotel, e eu gostaria de dizer que estamos em um silêncio sociável. Ele pelo menos parece em sua habitual tranquilidade, introspectivo. Quanto a mim, estou desesperadamente tentando avaliar como foi nosso café da manhã. Eu sinto como se eu tivesse sido entrevistada para uma posição, mas não estou certa para que.
         — Você sempre usa calça jeans? — Ele pergunta inesperadamente.
         — Geralmente.
         Ele movimenta a cabeça. Nós voltamos ao cruzamento, do outro lado da estrada do hotel. Minha mente está se recuperando. Que pergunta estranha… E estou ciente que nosso tempo juntos é limitado. É isto. Isto é tudo, e eu estraguei tudo completamente, eu sei. Talvez ele tenha alguém.
         — Você tem uma namorada? — Eu deixo escapar. Puta merda, eu acabei de dizer isto em voz alta?
         Seus lábios dão um meio sorriso, e ele olha para mim.
         — Não, Anastásia. Eu não sou do tipo que namora, — ele suavemente diz.
         Oh… o que isso quer dizer?  Ele é gay? Oh, talvez ele seja, merda! Ele deve ter mentido para mim em sua entrevista. E por um momento, eu acho que ele vai seguir com alguma explicação, alguma pista para esta declaração enigmática, mas ele não o faz. Eu tenho que ir. Eu tenho que tentar organizar meus pensamentos. Eu tenho que ficar longe dele. Eu caminho adiante, e tropeço, tropeço de cabeça na calçada.
         — Merda, Ana! — Grey grita.
Ele puxa a minha mão com tanta força, que eu caio para trás contra ele, enquanto um ciclista que passa a toda velocidade, quase me acertando, indo pelo caminho errado nesta rua de mão única.
         Tudo acontece tão rápido, que em um minuto estou caindo, no próximo eu estou em seus braços, e ele está me segurando firmemente contra seu tórax. Eu inalo seu cheiro limpo, cheiro vital. Ele cheira a roupa limpa e fresca, e a algum sabonete caro. Oh meu Deus, é inebriante. Eu inalo profundamente.
         — Você está bem? — Ele sussurra. Ele está com um braço ao meu redor, apertando-me junto a ele, enquanto os dedos de sua outra mão, suavemente rastreia meu rosto sondando, examinando-me. Seu polegar escova meu lábio inferior e eu ouço sua respiração ofegante. Ele está olhando fixamente em meus olhos, e eu seguro seu ansioso olhar, queimando por um momento ou talvez para sempre… mas eventualmente, minha atenção é atraída para sua bonita boca. Oh meu Deus.  E pela primeira vez em meus vinte e um anos, eu quero ser beijada. Eu quero sentir sua boca na minha.


[1] Referencia a nota de cinquenta dólares que tem a foto do presidente dos USA Ulisses Grant
[2] Fazendo uma brincadeira com o nome de Carl Bernstein que em parceria com Bob Woodward, trabalhando como repórter para o Washington Post, desvendou a história do caso Watergate
[3] Gopher é um protocolo de redes de computadores que foi desenhado para distribuir, procurar e ter acesso a documentos na Internet. Uma maneira de dizer que a pessoa é um pau para toda obra, ou de grande ajuda.
[4] Expressão idiomática americana que se refere a estar com o estomago doendo de nervosismo.
[5] English Breakfast tea – famosa marca de chá.
[6] No original em inglês está escrito sugar, que pode significar também uma maneira carinhosa de chamar a outra pessoa   

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