domingo, 19 de maio de 2013

50 Tons de cinza (Capítulo 2)


Meu coração está disparado. O elevador chega ao andar térreo, e eu desço assim que as portas se abrem, tropeçando mais uma vez, mas felizmente não caindo de bruços no chão de arenito imaculado. Eu corro para as largas portas de vidro, e por fim estou livre no tonificante, limpo, ar úmido de Seattle. Levantando meu rosto, eu dou boas-vindas à fresca chuva refrescante. Eu fecho meus olhos e tomo uma profunda e purificante respiração, tentando recuperar o que resta de meu equilíbrio.
         Nenhum homem jamais me afetou desse modo como Christian Grey o fez, e eu não posso entender o porquê.
         É sua aparência? Sua civilidade? Sua Riqueza? Seu Poder? Eu não entendo minha reação irracional.
         Eu dou um suspiro enorme de alívio. O que em nome dos céus foi tudo aquilo? Eu me inclino contra uma das colunas de aço do edifício, e valentemente tento me acalmar e juntar meus pensamentos. Eu agito minha cabeça. Puta merda, o que foi aquilo? Meu coração estabiliza, voltando ao seu ritmo regular, e eu posso respirar normalmente de novo. Eu me dirijo ao meu carro.
         Quando eu deixo os limites da cidade para trás, eu começo a me sentir tola e envergonhada, quando eu reproduzo a entrevista em minha mente. Certamente, eu estou reagindo a algo que está em minha imaginação. Certo, então ele é muito atraente, confiante, autoritário, à vontade consigo mesmo, mas por outro lado, ele é arrogante, e por todos os seus modos impecáveis, ele é ditador e frio. Bem, pelo menos a primeira vista.
         Um arrepio involuntário percorre minha espinha. Ele pode ser arrogante, entretanto ele tem o direito de ser, ele conseguiu tanto em uma idade tão jovem. Ele não suporta os imbecis, mas por que ele deveria? Novamente, eu estou irritada por Kate não me dar uma breve biografia dele.
         Enquanto cruzo ao longo da I-5, minha mente continua a vagar. Eu estou perplexa por existir gente tão empenhada em triunfar. Algumas de suas respostas eram tão enigmáticas, como se ele tivesse uma agenda oculta. As perguntas de Kate... ufa! A adoção e a pergunta se ele é gay! Eu estremeço. Eu não posso acreditar que eu disse aquilo. Que o chão, me engula agora!  Toda vez que eu pensar sobre esta pergunta no futuro, eu vou ficar corada de vergonha. Maldita Katherine Kavanagh!
         Eu verifico o velocímetro. Eu estou dirigindo mais cautelosamente do que eu estaria em qualquer outra ocasião. E eu sei que é a lembrança de dois olhos cinza penetrantes olhando para mim, e uma voz dura dizendo-me para dirigir cuidadosamente. Agitando minha cabeça, eu percebo que Grey está mais para um homem com o dobro de sua idade.
         Esqueça isto, Ana, eu ralho comigo mesmo. Eu chego à conclusão que isto foi uma experiência muito interessante, mas eu não deveria insistir nisto. Deixe isto para trás.  Eu nunca vou vê-lo novamente. Eu fico imediatamente alegre pelo pensamento. Eu ligo o play do MP3 e giro o volume bem alto, me encosto, e ouço o estrondoso rock alternativo quando eu pressiono o acelerador.
         Quando eu atinjo a I-5[1], eu percebo que eu posso dirigir tão rápido quanto eu quero.
         Nós vivemos em uma pequena comunidade de apartamentos dúplex em Vancouver, Washington, perto do campus de Vancouver da WSU. Eu tenho sorte dos pais de Kate terem comprado um lugar para ela, e eu pago amendoins pelo aluguel.[2] Isto já faz uns quatro anos. Quando eu desligo o carro, eu sei que a Kate vai querer que eu conte tim-tim por tim-tim da entrevista, ela é tenaz. Bem, pelo menos ela tem o mini gravador. Espero que eu não tenha que elaborar muito além do que foi dito durante a entrevista.
         — Ana! Você voltou. — Kate está sentada em nossa sala de estar, cercada por livros. Ela está claramente estudando para as provas finais, entretanto ela ainda está de pijamas de flanela rosa, decorado com coelhinhos fofinhos, aqueles que ela reserva quando acaba com um namoro, quando está doente, e quando está deprimida em geral. Ela pula em cima de mim e me abraça apertado.
         — Eu estava começando a me preocupar. Eu esperava que você voltasse mais cedo.
         — Oh, eu acho que compensei o tempo considerando que a entrevista funcionou. — Eu aceno com o mini gravador para ela.
         — Ana, muito obrigada por fazer isto. Eu fico te devendo, eu sei. Como foi? Como ele era? — Oh não, lá vamos nós, com a Inquisição de Katherine Kavanagh.
         Eu luto para responder suas perguntas. O que eu posso dizer?
         — Eu estou contente que terminei, e que eu não tenha que vê-lo novamente. Ele era bastante intimidante, sabe. — Eu encolho os ombros. — Ele é muito focado, intenso até, e jovem. Realmente jovem.
         Kate olha com ingenuidade para mim. Eu franzo a testa para ela.
         — Você, não se faça de inocente. Por que você não me deu uma biografia? Ele me fez sentir como uma idiota por me restringir as perguntas básicas. — Kate aperta uma mão em sua boca.
         — Jesus, Ana, eu sinto muito, eu não pensei.
         Eu bufo.
         — Na maior parte ele foi cortês, formal, ligeiramente sufocante, como se tivesse envelhecido antes do tempo. Ele não conversa como um homem de vinte e poucos anos. Que idade ele tem afinal?
         — Vinte e sete. Jesus, Ana, eu sinto muito. Eu devia ter informado você, mas eu estava em pânico. Deixe-me pegar o mini gravador, e eu vou começar a transcrever a entrevista.
         — Você parece melhor. Você comeu sua sopa? — Eu pergunto, ansiosa para mudar o assunto.
         — Sim, e estava deliciosa como sempre. Eu estou me sentindo muito melhor. — Ela sorri para mim em gratidão. Eu verifico meu relógio.
         — Eu tenho que correr. Eu posso ainda fazer meu turno na Clayton.
         — Ana, você está exausta.
         — Eu estarei bem. Eu vejo você mais tarde.
         Eu trabalho na Clayton desde que eu comecei na universidade. É a maior loja de ferragens de Portland, e durante os quatro anos em que eu trabalho aqui, eu conheci um pouco sobre quase tudo que vendemos, embora ironicamente, eu sou um desastre em trabalhos manuais. Eu deixo tudo isso para meu pai.
Eu sou muito mais o tipo de garota que se enrosca com um livro em uma confortável cadeira junto à lareira. Eu estou contente que eu possa fazer meu turno, pois isto me dá algo para me concentrar que não seja Christian Grey. Nós estamos ocupados, é o inicio da temporada de verão, e as pessoas estão redecorando suas casas. A Sra. Clayton está contente por me ver.
         — Ana! Eu pensei que você não fosse vir hoje.
         — Meu compromisso não demorou tanto tempo como eu pensei. Eu terminei em algumas horas.
         — Eu estou contente por ver você.
         Ela me manda para o deposito para começar a reabastecer as prateleiras, e eu logo fico absorvida na tarefa.
         Quando eu chego em casa mais tarde, Katherine está com os fones de ouvido, trabalhando em seu laptop.
         Seu nariz está ainda rosa, mas ela está super envolvida no seu trabalho, concentrada e digitando furiosamente. Eu estou exausta, completamente drenada pela longa viagem, a entrevista cansativa, e por permanecer de pé na Clayton. Eu afundo no sofá, pensando sobre a redação que eu tenho que terminar e todos os estudos que eu não fiz hoje, porque eu estava com… ele.
         — Você tem um bom material aqui, Ana. Você fez um bom trabalho. Eu não posso acreditar que você não aproveitou a oferta dele para mostrar a você o lugar. Ele obviamente queria passar mais tempo com você.
         Ela me lança um olhar fugaz e brincalhão.
         Eu ruborizo, e minha frequência cardíaca inexplicavelmente acelera. Estou certa que não foi isso. Ele só queria me mostrar o local, para que eu pudesse ver que ele é o senhor de tudo aquilo. Eu percebo que eu estou mordendo meu lábio, e eu espero que Kate não note. Mas ela parece absorvida em sua transcrição.
— Eu entendo o que você quer dizer sobre formal. Você tomou algumas anotações? — Ela pergunta.
         — Hum… não, eu não tomei.
         — Tudo bem. Eu ainda posso fazer um artigo bom com isto. Pena que não temos algumas fotos originais.  Bonito aquele filho da puta, não é?
         Eu ruborizo.
         — Eu acho que sim. — Eu tento duramente soar desinteressada, e eu acho que consegui.
         — Oh vamos, Ana, até você não pode ser imune a sua aparência. — Ela arqueia uma sobrancelha perfeita para mim.
         Merda!  Sinto que minhas bochechas ardem. Assim eu a distraio lisonjeando-a, sempre é um bom truque.
         — Você provavelmente teria conseguido muito mais dele.
         — Eu duvido, Ana. Ora... ele praticamente te ofereceu um emprego. Mesmo depois daquela pergunta que impus para você fazer, você foi muito bem. — Ela olha para mim especulativamente. Eu faço uma retirada apressada para a cozinha.
         — Então o que você realmente pensou sobre ele? — Maldição, ela é curiosa. Por que ela não pode simplesmente deixar isto passar? Pense sobre algo, rápido.
         — Ele é muito mandão, controlador, arrogante, realmente assustador, mas muito carismático. Eu posso entender o fascínio, — eu digo sinceramente, com a esperança que ela encerre este assunto uma vez por todas.
         — Você, fascinada por um homem? Está é a primeira vez, — ela bufa.
         Eu começo a juntar os ingredientes de um sanduíche, assim ela não pode ver meu rosto.
         — Por que você quis saber se ele era gay?  Alias, está foi uma pergunta muito embaraçosa. Eu fiquei mortificada, e ele ficou puto ao ser questionado também. — Eu franzo a testa com a memória.
         — Sempre que ele está nas páginas da sociedade, ele nunca está acompanhado.
         — Foi vergonhoso. A coisa inteira foi constrangedora. Eu estou contente que nunca mais tenha que por os olhos nele novamente.
         — Oh, Ana, não pode ter sido tão ruim. Eu penso que ele parece estar bastante interessado em você.
         Interessado em mim?  Agora Kate está sendo ridícula.
         — Você gostaria de um sanduíche?
         — Por favor.
         Não conversamos mais sobre Christian Grey aquela noite, para meu alívio. Uma vez que nós comemos, eu posso me sentar à mesa de jantar com Kate e, enquanto ela trabalha em seu artigo, eu trabalho em minha redação sobre Tess de D 'Urbervilles.[3] Maldição, esta mulher estava no lugar errado, no tempo errado, no século errado. Quando eu termino, é meia-noite, e Kate já tinha ido há muito tempo para a cama. Eu faço meu caminho para meu quarto, exausta, mas contente que eu fiz tanto para uma segunda-feira.
         Eu me enrolo em minha cama de ferro branco, embrulhando uma colcha de minha mãe ao meu redor, fecho meus olhos e durmo imediatamente. Naquela noite eu sonho com lugares escuros, sombrios pisos brancos frios, e olhos cinza.
         Pelo resto da semana, eu me dedico em meus estudos e no meu trabalho na Clayton. Kate está ocupada também, compilando sua última edição de sua revista estudantil, antes dela ter que cedê-la para o novo editor, ao mesmo tempo estudando para seus exames finais.
Na quarta-feira, ela está muito melhor, e eu não tenho mais que suportar a visão de seus pijamas com rosa e coelhinhos. Eu telefono para minha mãe na Geórgia para saber como ela está, mas também para que ela possa me desejar sorte em meus exames finais. Ela começa a me contar sobre sua mais nova aventura: está aprendendo a fazer vela. Minha mãe adora aprender coisas novas. Basicamente, ela se entedia e busca coisas novas para preencher seu tempo, mas é impossível ela manter a atenção durante muito tempo em alguma coisa. A semana que vem será uma nova aventura.
         Ela me preocupa. Eu espero que ela não hipoteque a casa para financiar esta nova aventura. E eu espero que Bob, seu relativamente novo marido, muito mais velho, esteja de olho nela agora que eu não estou mais lá. Seu terceiro marido parecer ser um cara centrado.
         — Como estão às coisas com você, Ana?
         Por um momento, eu hesito, e eu tenho toda a atenção de minha mãe.
         — Eu estou bem.
         — Ana? Você encontrou alguém? — Uau… como ela faz isto?  A excitação em sua voz é palpável.
         — Não, mãe, não é nada. Você será a primeira a saber se eu o achar.
         — Ana, você realmente precisa sair mais, doçura. Você me preocupa.
         — A mãe, eu estou bem. Como está Bob? — Como sempre, a distração é a melhor política.
         Mais tarde naquela noite, eu chamo Ray, meu padrasto, Marido Número Dois de mamãe, o homem que eu considero sendo meu pai, e o homem cujo nome eu carrego. É uma conversa breve. De fato, não é tanto uma conversa, é mais uma série unilateral de grunhidos em resposta para a minha gentil persuasão. Ray não é muito de falar. Mas ele é muito ativo, quando ele não esta assistindo futebol na televisão, vai aos jogos de boliche, prática pesca com mosca,[4] ou fazendo mobília. Ray é um carpinteiro qualificado, e a razão de eu saber a diferença entre um falcão e um serrote. Tudo parece bem com ele.
         Sexta feira à noite, Kate e eu estamos debatendo o que fazer com nossa noite, nós queremos dar um tempo em nossos estudos, em nosso trabalho, dos jornais estudantis, quando a campainha toca.
         Parado em nossa soleira está meu bom amigo José, segurando uma garrafa de champanhe.
         — José! Bom te ver! — Eu dou-lhe um abraço rápido. — Entre.
         José é a primeira pessoa que eu encontrei quando cheguei na universidade, parecia tão perdido e solitário com eu.
         Nós reconhecemos uma alma gêmea em cada um de nós naquele dia, e nós temos sido amigos desde então.
         Não só compartilhamos um senso de humor, mas nós descobrimos que tanto Ray como o Sr. José estiveram na mesma unidade do exército juntos. Como resultado, nossos pais se tornaram grandes amigos também.
         José estuda engenharia e é o primeiro de sua família a ir para a faculdade. Ele é malditamente brilhante, mas sua verdadeira paixão é a fotografia. José tem um bom olho para uma boa foto.
         — Eu tenho novidades. — Ele sorri, com seus olhos escuros brilhando.
         — Não me diga que você conseguiu ser expulso por mais uma semana, — eu provoco, e ele faz uma careta brincalhona para mim.
         — A galeria Portland Place vai exibir minhas fotografias no próximo mês.  
         — Isto é incrível, parabéns! — Satisfeita por ele, eu o abraço novamente. Kate sorri para ele também.
         — É isto aí José! Eu devia pôr isto no jornal. Nada como mudanças editoriais de último minuto em uma sexta-feira à noite. — Ela sorri.
         — Vamos celebrar. Eu quero que você venha para a abertura. — José olha atentamente para mim. Eu ruborizo.
         — Você duas claro, — ele adiciona, olhando nervosamente para Kate.
         José e eu somos bons amigos, mas eu sei que lá no fundo, ele gostaria de ser mais que isto. Ele é atraente e engraçado, mas não é para mim. Ele é mais como um irmão que eu nunca tive. Katherine frequentemente me provoca dizendo que está faltando um namorado em minha vida, mas a verdade é que eu não conheci ninguém que... bem, me atraísse,  embora uma parte de mim anseie pelos joelhos trêmulos, o coração saindo pela boca, o friozinho na barriga e noites sem dormir.
         Às vezes me pergunto se existe algo de errado comigo. Talvez eu gaste muito tempo na companhia de meus heróis românticos literários, e consequentemente minhas ideais e expectativas são extremamente altos. Mas na verdade, ninguém nunca me fez sentir assim.
         Até muito recentemente, a indesejável, vozinha em meu subconsciente sussurra.
         NÃO! Eu enterro o pensamento imediatamente. Sem essa, não depois daquela entrevista dolorosa. Você é gay, Sr. Grey?  Eu estremeço com a memória. Eu sei que eu sonhei com ele quase todas as noites desde então, mas isto é apenas para eliminar a experiência terrível da minha mente, certo?
         Eu assisto José abrir a garrafa de champanhe. Ele é alto, em sua calça jeans e camiseta, ele é todo ombros e músculos, pele bronzeada, cabelos escuros e olhos escuros ardentes. Sim, Jose é bastante quente, mas eu acho que ele está finalmente entendendo a mensagem: Nós somos apenas amigos. A rolha estala alto, e José olha para cima e sorri.
         Sábado na loja é um pesadelo. Nós recebemos vários clientes que querem enfeitar suas casas.  O Sr e a Sra. Clayton, John e Patrick, os outros empregados, estamos correndo apressados. Mas há uma trégua na hora do almoço, e a Sra. Clayton me pede para verificar algumas ordens enquanto eu estou sentada atrás do balcão do caixa discretamente comendo minha rosquinha. Eu estou absorta na tarefa, verificando os números do catálogo dos itens que temos e precisamos encomendar, os olhos passando rapidamente no livro de ordem para a tela do computador enquanto eu verifico se as entradas batem. Então, por alguma razão, eu olho para cima… e encontro-me presa no cinzento olhar ousado de Christian Grey, que está de pé no balcão, encarando-me atentamente.
         Meu coração para.
         — Senhorita Steele. Que surpresa agradável. — Seu olhar é firme e intenso.
         Puta merda. Que diabos ele está fazendo aqui, ele está com os cabelos despenteados, vestindo um suéter creme, jeans e botas? Acho que fiquei boquiaberta, e eu não posso localizar meu cérebro ou minha voz.
         — Sr. Grey, — eu sussurro, porque isto é tudo que eu posso fazer. Há uma sombra de um sorriso em seus lábios e seus olhos estão iluminados com humor, como se ele estivesse desfrutando de alguma piada particular.
         — Eu estava na área, — ele diz por via de explicação. — Eu preciso abastecer algumas coisas. É um prazer ver você novamente, Senhorita Steele. — Sua voz é morna e rouca, como calda de caramelo derretido em chocolate escuro… ou algo assim.
         Eu agito minha cabeça para reunir meu juízo. Meu coração está batendo freneticamente, e por alguma razão eu estou corando furiosamente sob seu olhar minucioso. Eu estou totalmente deslocada pela visão dele de pé diante de mim. Minhas lembranças dele não lhe fazem justiça. Ele não é apenas bonito, ele é o epítome da beleza masculina, de tirar o fôlego, e ele está aqui. Aqui nas lojas Clayton. Vá entender. Finalmente minhas funções cognitivas é restabelecidas e reconectadas com o resto de meu corpo.
         — Ana. Meu nome é Ana, — eu murmuro. — Em que posso ajudá-lo, Sr. Grey?
         Ele sorri, e novamente é como se ele conhecesse algum grande segredo. E tão desconcertante. Respirando fundo, eu coloco minha fachada de profissional de quem trabalha nesta loja há anos. Eu posso fazer isto.
         — Há alguns itens que eu preciso. Para começar, eu gostaria de algumas braçadeiras, — ele murmura, seus olhos cinza frios, mas divertidos.
         Braçadeiras?
         — Nós temos de vários comprimentos. Eu devo mostrar a você? — Eu murmuro, minha voz suave e oscilante.
         Controle-se, Steele. Um leve franzir estraga por sua vez a testa do adorável Grey.
         — Por favor. Vá na frente, Senhorita Steele, — ele diz. Eu tento parecer indiferente quando eu saio detrás do balcão, mas realmente eu estou muito concentrada em não tropeçar nos meus próprios pés, minhas pernas de repente estão na consistência de gelatina. Eu estou tão contente por ter decidido vestir meu melhor jeans esta manhã.
         — Elas estão junto aos bens elétricos, no corredor oito. — Minha voz está um pouco resplandecente. Eu olho para ele e lamento quase que imediatamente. Maldição, ele é bonito. Eu ruborizo.
         — Depois de você, — ele murmura, gesticulando com seus longos dedos de sua mão bem cuidada. Com meu coração quase me estrangulando, porque ele está quase passando pela minha garganta, está tentando escapar de minha boca, começo a me encaminhar a seção de eletrônicos. Por que ele está em Portland?
         Por que ele está aqui na Clayton?  E uma minúscula parte do meu cérebro que utilizo, provavelmente localizada na base de minha medula oblonga[5] onde habita meu subconsciente, diz: Ele está aqui para vê-la.  Sem chance! Eu dispenso isto imediatamente. Por que este belo, poderoso e urbano homem, quer me ver? A ideia é absurda, e eu excluo isto de minha cabeça.
         — Você está em Portland a negócios? — Eu pergunto, e minha voz é muito alta, como se eu tivesse preso meu dedo em uma porta ou algo assim. Maldição! Tente ficar fria Ana!
         — Eu estava visitando a divisão agrícola da universidade. Que está localizada em Vancouver. Eu estou atualmente financiando algumas pesquisa lá, sobre rotação de colheita e ciência do solo, — ele discute o assunto com naturalidade. Vê?
         Não está aqui para encontrar você afinal, meu subconsciente zomba de mim, alto, orgulhoso, e rabugento. Eu ruborizo com meus tolos pensamentos impertinentes.
         — Tudo parte de seu plano de alimentar o mundo? — Eu provoco.
         — Algo assim, — ele reconhece, e seus lábios satirizam em um meio sorriso.
         Ele olha para a seleção de braçadeiras que nós temos em estoque na Clayton. O que ele vai fazer com isso? Eu não posso imaginá-lo fazendo um trabalho manual usando isso.  Seus dedos deslizam sobre os vários pacotes da prateleira, e por alguma razão inexplicável, eu tenho que desviar o olhar. Ele se curva e seleciona um pacote.
         — Estes servirão, — ele diz com o seu sorriso de que está guardando um segredo, e eu ruborizo.
         — Gostaria de mais alguma coisa?
         — Eu gostaria de algumas fitas adesivas.
         Fita adesiva?
         — Você está redecorando sua casa? — As palavras escapam antes que eu possa detê-las. Certamente ele contrata operários ou tem pessoal para ajudá-lo a decorar?
         — Não, não redecorando, — ele diz depressa então sorri, e eu tenho a sensação estranha que ele está rindo de mim.
         Eu sou tão engraçada assim? Pareço engraçada?
         — Por aqui, — eu murmuro envergonhada. — a fita adesiva está no corredor de decoração.
         Eu olho para trás à medida que ele me segue.
         — Você trabalha aqui há muito tempo? — Sua voz é baixa, e ele está olhando para mim, olhos cinza muito concentrados. Eu ruborizo ainda mais intensamente. Por que diabos ele tem este efeito sobre mim?
         Eu me sinto com quatorze anos de idade, desajeitada como sempre, e fora do lugar. Olhos para frente Steele!
         — Quatro anos, — eu murmuro quando nós alcançamos nosso objetivo. Para me distrair, eu passo e seleciono duas fitas adesivas largas.
         — Eu vou levar essa, — Grey diz suavemente apontando para a fita mais larga, que eu passo para ele.
         Nossos dedos se tocam muito brevemente, e a corrente está lá novamente, atravessando por mim como se eu tivesse tocado um fio exposto. Eu ofego involuntariamente quando eu sinto isto, essa corrente percorre todo meu corpo até em algum lugar escuro e inexplorado, no fundo de minha barriga. Desesperadamente, eu consigo de volta o meu equilíbrio.
         — Mais alguma coisa? — Minha voz é rouca e ofegante. Seus olhos se arregalam ligeiramente.
         — Algumas cordas, eu acho. — Sua voz reflete a minha, rouca.
         — Por aqui. — E abaixo minha cabeça para esconder meu recorrente rubor e dirijo-me para o corredor.
         — Que tipo você está procurando? Nós temos corda de filamento sintético e natural… barbantes... fio de corda… — eu me detenho em sua expressão, seus olhos escurecendo. Puta merda.
         — Eu vou levar cinco metros de corda de filamentos naturais, por favor.
         Rapidamente, com dedos trêmulos, eu meço cinco metros contra a régua fixa, ciente que seu quente olhar cinza está em mim. Eu não ouso olhar para ele. Jesus, eu podia me sentir mais tímida? Pegando minha faca Stanley do bolso de trás de minha calça jeans, eu corto-a, então enrolo cuidadosamente antes de amarrá-la em um nó corrediço. Por algum milagre, eu consigo não arrancar um dedo com minha faca.
         — Você era Escoteira? — Ele pergunta divertido, franzindo seus lábios sensuais e esculpidos. Não olhe para sua boca!
         — Só organizada, as atividades em grupo não são realmente minha praia, Sr. Grey.
         Ele arqueia uma sobrancelha.
         — E qual é sua praia, Anastásia? — Ele pergunta, sua voz suave e seu sorriso secreto estão de volta. Eu olho para ele incapaz de me expressar. O chão parece placas tectônicas e movimento. Tente se tranquilizar, Ana, meu torturado subconsciente implora de joelhos.
         — Livros, — eu sussurro, mas por dentro, meu subconsciente está gritando: Você! Você é minha praia
         Eu o esbofeteio imediatamente, mortificada com os delírios da minha mente.
         — Que tipo de livros? — Ele dobra sua cabeça para um lado. Por que ele está tão interessado?
         — Oh, você sabe. O habitual. Os clássicos. Literatura britânica, principalmente.
         Ele esfrega seu queixo com seu dedo indicador e o longo dedo polegar enquanto ele contempla minha resposta.
         Ou talvez ele esteja apenas muito entediado e tentando esconder isto.
         — Você precisa de alguma outra coisa? — Eu tenho que sair deste assunto, aqueles dedos naquele rosto são muito sedutores.
         — Eu não sei. O que mais você recomenda?
         O que eu recomendo? Eu sequer sei o que você está fazendo.
         — Para um trabalho manual?
         Ele movimenta a cabeça, olhos cinza vivos com humor perverso. Eu ruborizo, e meus olhos se desviam por vontade própria para sua calça jeans confortável.
         — Macacões, — eu respondo, e eu sei que eu não estou mais despistando o que sai de minha boca.
         Ele levanta uma sobrancelha, divertido, mais uma vez.
         — Você não quer estragar sua roupa, — eu gesticulo vagamente na direção de sua calça jeans.
         — Eu sempre posso lavá-las. — Ele sorri.
         — Hum. — Eu sinto a cor em meu rosto subindo novamente. Eu devo estar da cor do manifesto comunista. Pare de falar. Pare de falar AGORA.
         — Eu vou levar alguns macacões. Deus me livre de arruinar qualquer roupa, — ele diz secamente.
         Eu tento e descarto a imagem indesejada dele sem jeans.
         — Você precisa de mais alguma outra coisa? — Eu pergunto quando eu entrego-lhe o macacão azul.
         Ele ignora minha investigação.
         — Como está indo o artigo?
         Ele finalmente me faz uma pergunta normal, longe de toda a insinuação e a conversa confusa de duplo sentido… uma pergunta que eu posso responder. Eu agarro isto firmemente com as duas mãos, como se fosse um bote salva-vidas, e eu sou honesta.
         — Eu não estou escrevendo-o, Katherine está. A Srta Kavanagh. Minha companheira de quarto, ela é a escritora. Ela está muito feliz com isto. Ela é a editora da revista, e ficou devastada por não poder fazer a entrevista pessoalmente. — Eu me sinto como se eu emergisse para o ar, enfim um tópico normal de conversação. — Sua única preocupação é que ela não tem nenhuma fotografia original sua.
         Grey levanta uma sobrancelha.
         — Que tipo de fotografia ela quer?
         Ok. Eu não tinha previsto esta resposta. Eu sacudo a cabeça, porque eu simplesmente não sei.
         — Bem, eu estou por perto. Amanhã, talvez… — ele é vago.
         — Você estaria disposto a participar de uma sessão de fotos? — Minha voz é estridente novamente. Kate estaria no sétimo céu se eu puder tirá-las. E você pode vê-lo novamente amanhã, sussurra sedutoramente para mim aquele lugar escuro na base de meu cérebro. Eu descarto a ideia, tola e ridícula…
         — Kate ficará encantada se nós pudermos achar um fotógrafo. — Eu estou tão contente, eu sorrio para ele amplamente. Seus lábios abrem como se ele estivesse tomando um influxo forte de ar, e ele pisca. Por uma fração de segundo, ele parece perdido de alguma maneira, e a Terra se desloca ligeiramente sobre seu eixo, as placas tectônicas resvalam para uma nova posição.
         Meu Deus. O olhar perdido de Christian Grey.
         — Avise-me sobre amanhã. — Alcançando seu bolso de trás, ele retira sua carteira. — Meu cartão. Tem meu número do celular nele. Você precisa chamar antes das dez da manhã.
         — Ok. — Eu sorrio para ele. Kate vai ficar emocionada.
         — ANA!
         Paul se materializou do outro lado no final do corredor. Ele é o irmão mais novo do Sr. Clayton. Eu ouvi que ele estava em casa de Princeton, mas eu não estava esperando vê-lo hoje.
         — Ah, com licença por um momento, Sr. Grey. — Grey faz um cara feia quando eu me afasto dele.
         Paul sempre foi um amigo, e neste momento estranho que eu estou tendo com o rico, poderoso, impressionante fora de comparação, atraente e controlador, é ótimo conversar com alguém que seja normal. Paul me abraça apertado pegando-me de surpresa.
         — Ana, oi, é tão bom ver você! — Ele esguicha.
         — Oi Paul, como você está? Você está em casa para o aniversário de seu irmão?
         — Sim. Você está parecendo bem, Ana, realmente bem. — Ele sorri enquanto ele me examina de certa distancia. Então ele me libera, mas mantém um braço possessivo caído sobre meu ombro. Eu me embaralho de um pé para outro, envergonhada. É bom ver Paul, mas ele sempre foi muito familiar.
         Quando eu olho para Christian Gray, ele está nós observando como um falcão, seus olhos cinza encobertos e especulativos, sua boca uma dura linha impassível. Ele mudou de forma estranha, do cliente atento para outra pessoa, alguém frio e distante.
         — Paul, eu estou com um cliente. Alguém que você deve conhecer, — eu digo, tentando desarmar o antagonismo que eu vejo nos olhos de Grey. Eu arrasto Paul acima para encontrá-lo, e eles se medem um ao outro. A atmosfera de repente é ártica.
         — Ah, Paul, este é Christian Gray. Sr. Grey, este é Paul Clayton. Seu irmão é o dono do lugar. — E por alguma razão irracional, eu sinto que eu tenho que explicar um pouco mais.
         — Eu conheço Paul desde que eu trabalho aqui, entretanto nós não nos vemos com frequência. Ele chegou de Princeton onde ele está estudando administração de empresas. — Eu estou balbuciando… Pare, agora!
         — Sr. Clayton. — Christian sustenta seu aperto, seu olhar ilegível.
         — Sr. Grey, — Paul retorna seu aperto de mão. — Espere, não Christian Grey? Da Grey Holdings Enterprise? — Paul vai de mal humorado para impressionado em menos de um nano segundo. Grey lhe dá um sorriso cortês que não alcança seus olhos.
         — Uau, há alguma coisa em que eu possa ajudá-lo? 
         — Anastásia tem me ajudado, Sr. Clayton. Ela tem sido muito atenciosa. — Sua expressão é impassível, mas suas palavras… é como se ele estivesse dizendo outra coisa completamente diferente. É desconcertante.
         — Legal, — Paul responde. — Vejo você mais tarde, Ana.
         — Certo, Paul. — Eu assisto-o desaparecer em direção á sala de estoque. — Mais alguma coisa, Sr. Grey?
         — Só estes itens. — Seu tom é cortante e frio. Porra… eu o ofendi? Respirando fundo, eu viro e dirijo-me ao caixa. Qual é o seu problema? 
         Eu carrego a corda, macacões, fita adesiva e as braçadeiras até o caixa.
         — Isso deu quarenta e três dólares, por favor. — Eu olho para Grey, e desejei não ter feito isso. Ele está me observando de perto, seus olhos cinza intensos e escurecidos. É enervante.
         — Você gostaria de uma sacola? — Eu pergunto enquanto eu pego seu cartão de crédito.
         — Por favor, Anastásia. — Sua língua acaricia meu nome, e meu coração mais uma vez fica frenético.
         E mal posso respirar. Apressadamente, eu coloco suas compras em uma sacola de plástico.
         — Você me liga se você quiser que eu faça a sessão de fotos? — Ele é todos negócios mais uma vez. Eu aceno, sem palavras mais uma vez, e devolvo seu cartão de crédito.
         — Ótimo. Até amanhã talvez. — Ele vira-se para partir, depois faz uma pausa. — Ah, e Anastásia, eu estou feliz que a Senhorita Kavanagh não pôde fazer a entrevista. — Ele sorri, então anda a passos largos com o propósito renovado para fora da loja, atirando a sacola plástica acima de seu ombro, deixando-me uma massa trêmula e furiosa de hormônios femininos. Eu passo vários minutos olhando fixamente para a porta fechada pela qual ele acabou de sair antes de retornar ao planeta Terra.
         Certo, eu gosto dele. Eu admito, isto para mim mesma. Eu não posso esconder meu sentimento mais. Eu nunca me senti assim antes. Eu o acho atraente, muito atraente. Mas ele é uma causa perdida, eu sei, e eu suspiro com um pesar agridoce. Foi apenas uma coincidência, sua vinda aqui. Mas ainda assim, eu posso admirá-lo de longe, certamente? Nenhum dano pode resultar disto. E se eu encontrar um fotógrafo, eu posso seriamente contemplá-lo amanhã. Eu mordo meu lábio em antecipação e eu me encontro sorrindo como uma colegial. Eu preciso telefonar para Kate e organizar uma sessão de fotos.
                    


[1] Interestadual - 5
[2]     Se você paga com amendoins, você obtêm macacos. Ditado popular nos EUA que significa que você paga uma mixaria (muito pouco) 
[3] Tess of the D'Ubervilles:, é um romance de Thomas Hardy, publicado pela primeira vez em 1891. Considerada uma obra importante da literatura Inglesa.
[4] Pesca com mosca é a tradução do termo em inglês Fly Fishing, por muitos conhecidos como pesca com fly ou apenas fly. Para os brasileiros, o termo correto é pesca com mosca.
[5] Bulbo raquidiano, bolbo raquidiano, medulla oblongata, medula oblonga, ou simplesmente bulbo é a porção inferior do tronco encefálico, juntamente com outros órgãos como o mesencéfalo e a ponte, que estabelece comunicação entre o cérebro e a medula espinhal.

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