— Me transforme — Jenny
pediu, com um olhar tão intenso que poderia ter
me cravado na parede atrás de mim. — Me transforme numa
vampira.
Seu pescoço
era branco como leite, como uma tela em branco ou o
caderno no primeiro dia de aula. As poucas sardas ao
redor da clavícula
saltavam na minha direção como se fossem alvos. Crave
seus dentes aqui,
pareciam dizer. Bem aqui. Uma das veias parecia
especial, saliente, pronta para
explodir. A jugular. Dois anos antes eu havia aprendido
sobre a jugular, a
maior veia do corpo, que transporta grande parte do
sangue. Meu professor de
biologia não tinha previsto que essa lição se tornaria
um perigo em minhas
mãos. Mas, nos últimos meses, era o que tinha
acontecido.
Eu tinha de
admitir que a oportunidade era perfeita. Jenny era pequena,
mais de um palmo mais baixa que eu, e pesava no máximo
quarenta e cinco
quilos. Não era apenas fraca e indefesa — ela queria
ser uma vítima.
O cenário
também era perfeito, coisa de filme de terror barato e romance
de Mary Shelley. Eu e Jenny estávamos num beco escuro.
Aos pés dela, folhas
secas, sujeira e uma pomba destroçada. Com exceção de
uma fraca luz
cintilante que vinha do terceiro andar, nada nem
ninguém nos interrompia.
Não havia testemunhas.
Mas eu
queria, queria muito que alguém aparecesse. Turistas perdidos
com sotaque do sul, batedores de carteira, qualquer um.
Rezava para alguém
nos interromper. Me sentia completamente maluco por ter
começado isso
|
tudo. Toda essa mentira.
Já passei
por várias situações na minha vida em que, não importava o que
fizesse, não poderia vencer. E lá estava eu de novo.
Então, torcendo por uma
inspiração e rezando por um milagre, botei os dentes
para fora, inclinei a
cabeça e avancei em direção ao pescoço dela...
Epa, espere
um pouco. Acho que estou contando tudo do jeito errado.
Isso me faz parecer um desses vampiros malvados, de
filmes de terror, que
saem por aí farejando e encurralando suas vítimas para
depois chupar o sangue
delas e transformá-las em vampiros contra sua vontade.
Na verdade, eu estava
tão assustado quanto Jenny naquele beco — e ainda mais
inseguro. Queria
mesmo que alguém surgisse ali, um policial, um
sem-teto, um super-herói. Eu
me sentia tão inseguro naquele momento porque jamais
havia transformado
alguém em vampiro antes.
Bom, isso
não é verdade. Fui eu mesmo que me transformei em vampiro.
E, para
falar a verdade, eu me tornei um vampiro em circunstâncias bem
normais. Não normais como nos casos que envolvem becos
e pescoços à
mostra, ou como nas cenas de livros de ficção ou filmes
de terror. Meus
pulsos não estavam presos por correntes ensanguentadas.
Eu não estava num
porão cheio de cruzes e com as janelas cobertas.
Ninguém pairava
perigosamente perto da minha garganta exposta. Não
havia caninos sedentos
prontos para atacar. Não havia caixões despedaçados,
castelo na Transilvânia
ou morcegos enfurecidos. Ninguém estava usando capa —
muito menos eu.
Eu me
transformei em vampiro no terceiro vagão do trem do condado de
Westchester, em Nova York. Eu era um aluno católico do
Meio-Oeste, criado
à base de Tang e que nunca devolvia os livros da
biblioteca no prazo. E me
transformar em vampiro daquele jeito foi normal para
mim, já que aprendi
sozinho a dar um nó Windsor na gravata e a cantar a
música ―Changes‖, do
Tupac Shakur, em latim — e também aprendi sozinho que,
se usasse um nó
Windsor ou recitasse ―Changes‖, do Tupac Shakur, em latim na frente de todo
mundo, acabaria apanhando. Tá certo, talvez eu tenha
aprendido essas duas
últimas lições com outras pessoas, contra minha
vontade. Mas fui eu que
escolhi me transformar em vampiro.
Personagens
de livros e filmes raramente se tornam vampiros por opção.
|
Geralmente são encurralados contra um caixão ou uma
parede num castelo e
têm seu sangue sugado enquanto se contorcem e se debatem
em agonia. Virar
vampiro machuca. Ou, no meu caso, é um pé no saco. Para
―se transformar‖
por vontade própria, você precisa estar à beira da
morte, ou tão de saco cheio
do ser humano patético que você é que abriria mão da
própria mortalidade em
troca de qualquer mudança. Pensando nisso agora, vejo
que tinha mesmo
chegado a esse beco sem saída, a essa situação de
desespero e de decepção
comigo mesmo. E agora tento lembrar como cheguei a esse
ponto.
Talvez tenha
começado com a mudança para Nova York.
Cresci em
Alexandria, Indiana. Bem, ―cresci‖ é modo de falar. Morei lá
até os 16 anos, mas tive sorte e continuei crescendo
depois disso. Já tinha mais
de um metro e oitenta de altura, mas em termos de pelos
na cara estava
atrasado, então é provável que ainda não tivesse
alcançado a maturidade.
Enfim, Alexandria, Indiana. O lugar é famoso por ser o
lar da Maior Bola de
Tinta do Mundo. E o que é uma bola de tinta?, você
questiona. Boa pergunta.
É uma bola de beisebol de tamanho normal com mais de 21.500
camadas de
tinta. Você pode conferir nos cartões de Natal da nossa
família dos últimos
doze anos. Tiramos uma foto na frente da bola todo ano.
Meu pai era
gerente regional de vendas de uma empresa de eletrônicos.
Ele era como um desses caras da CIA que vão para o
escritório e voltam para
casa sem nunca falar sobre o que fazem. A única parte
do trabalho que ele
trazia para casa era sua paixão por engenhocas
eletrônicas. Isso deixava minha
mãe maluca, pois ela tem verdadeiro pânico de
tecnologia e acha que qualquer
coisa que liga na tomada pode causar câncer. Embora meu
pai seja
completamente sem noção, alguém certo dia achou que ele
era esperto o
suficiente para ser promovido a consultor. E assim ele
foi transferido para o
escritório de Nova York. Ao que parece, um consultor é
alguém que espia por
cima do seu ombro enquanto você faz o seu trabalho e
diz como você pode
fazer melhor. Eu não conseguia imaginar meu pai fazendo
isso. Já minha
mãe...
Meu irmão,
Luke, e eu havíamos acabado de terminar o primeiro ano do
ensino médio na escola católica St. Luke, que não
ficava muito longe. Luke era
running back do time de futebol americano e armador do time de basquete. Ele
|
havia se saído tão bem nos dois esportes aquele ano que
os treinadores
prometeram que ele começaria na categoria júnior.
Quanto a mim, fui
promovido a editor da revista literária. Tá bom, fui
promovido de único
colaborador a editor. E, tá certo, a St. Luke’s Lit
tinha uma circulação de cinco
exemplares (lidos por mim, o orientador da escola,
minha mãe e dois
estudantes anônimos que tinham tanta vergonha disso que
não colocaram os
nomes em uma pesquisa). Mas ―editor da revista
literária‖ cairia bem quando
eu tentasse entrar na faculdade.
Só que eu
não aguentava mais aquela escola. Apesar da minha poderosa
posição na revista, ninguém me respeitava de verdade.
Principalmente um
garoto chamado Johnny Frackas, que estava sempre me
enchendo. Todo
mundo o chamava de ―Johnny Sardas‖ (tanto por suas sardas quanto pelas que
cobriam o corpo inteiro da mãe dele, assunto de muita
especulação na escola),
o que fez com que ele ficasse zangado e descontasse sua
raiva em quem
estivesse mais perto. Graças à obsessão do colégio pela
ordem alfabética, essa
pessoa era eu: Finbar Frame. Todas as manhãs do nono
ano, Johnny Frackas
saudava minha chegada à sala de aula com um “Bom dia, Frutinha” e uma risada
estridente. No primeiro ano do ensino médio, fui
promovido a Almirante
Frutinha. Na verdade, aquilo deveria ter feito dele um
idiota, já que se tratava
de uma referência a O retorno de Jedi, mas mostrar isso
aos outros não me fez
ganhar ponto algum. E eu deveria ter sido protegido
dessa tortura pelo meu
irmão gêmeo, que tinha o mesmo sobrenome que eu e,
dessa forma, deveria
estar na mesma sala que eu na escola. Mas Luke mal
aparecia nas aulas, pois
seus treinadores de futebol americano e de basquete
conseguiam dispensas
para tudo. Eu estava por minha conta.
As manhãs de
segunda-feira no primeiro ano eram as piores. A maioria
dos caras estava começando a tirar a carteira de
motorista, a arranjar
namoradas e identidades falsas que não tinham a menor
graça para os donos
de bares. Outros esperavam ansiosamente pelo fim de
semana para ir a festas
jogar pingue-pongue de cerveja, vomitar até as tripas e
beijar garotas (espero
que não os dois ao mesmo tempo, se bem que eu já ouvi
histórias...). Nada
disso acontecia comigo, nem a parte de botar as tripas
para fora.
Não é que
nunca me convidassem para nada. Na verdade, meu irmão me
|
convidava para tudo. Toda sexta-feira à tarde ele
atravessava o longo corredor
que separava meu quarto do dele e dizia:
— Ei, o
irmão do Sean O’Connor deu três caixas de cerveja para ele. As
latas estão todas amassadas, mas ele pesquisou no
Google e disse que é muito
difícil a gente pegar botulismo. Vem beber com a gente!
Ou:
— A irmã
gostosa da Maddy Keller voltou da Suécia e as duas estão
dando uma festa. Com garotas suecas! Elas são as mais
gostosas depois das
brasileiras. Finn, você tem que ir. Vai ser a-ni-mal!
Ou:
— Você viu a
propaganda daquele filme de terror em que aquela garota
do Disney Channel mostra os peitos? O time todo vai
ver, vem junto! —
Pausa. — E tem serra elétrica, brou!
Para o meu
irmão, cheio de energia e otimismo, um monte de coisa era a-
ni-mal. Isso porque, toda vez que Luke entrava em algum
lugar, era um
festival de aplausos e adoração. Para ele, toda festa
do colégio era como a
estreia de um filme com direito a tapete vermelho — e
ele era o Vince Chase,
do Entourage. As pessoas brigavam para falar com ele e
fazer perguntas. As
meninas puxavam a roupa dele e pediam autógrafo. Os
garotos o chamavam
por apelidos esquisitos que tinham inventado enquanto
bebiam Gatorade no
campo de futebol. Todo mundo ficava feliz por ver o
Luke.
Eu podia
imaginar como caras como, digamos, Johnny Frackas reagiriam
ao me ver numa festa com garotas suecas e me sentindo
parte da turma. Ou
como Sean O’Connor se sentiria se um nerd qualquer
aparecesse para beber
uma de suas preciosas cervejas amassadas. Ou como iam
rir se me vissem
tentando plantar bananeira em cima de um barril de
chope (uma vez Luke me
obrigou a fazer isso quando nossos pais estavam fora, e
depois daquilo me
convenci de que você precisa ser um atleta olímpico
para conseguir). Não é
que eu não gostasse de garotas suecas ou de filmes de
terror. E não é que eu
não gostasse do Luke. Eu gostava dele, mas não queria
andar por aí com os
outros idiotas do St. Luke.
|
Eu nunca diria ao meu irmão que tinha medo que seus
amigos viessem
|
me encher o saco. Primeiro, porque ele nunca teve
problemas com interações
sociais e jamais entenderia. Em segundo lugar, Luke
entendia tudo ao pé da
letra e poderia dizer a eles: ―Não encham o saco do meu
irmão‖ — o que,
obviamente, teria o efeito contrário.
Assim, de
vez em quando eu dava uma desculpa legítima para o meu
irmão, como ―Estou cansado de andar com os caras do
colégio‖.
Às vezes eu
apelava para algo mais ridículo e dizia, bem sério: ―Ah, eu
não posso beber essa cerveja. Morro de medo de
botulismo‖.
Ou, sobre o
filme: ―Ouvi dizer que a garota do Disney Channel é na
verdade um travesti‖.
Ou, sobre a
festa: ―Pena que as suecas fazem voto de castidade até os 25
anos. É verdade, eu li em algum lugar. O governo obriga
todas elas a fazer‖.
Mas Luke não
tinha medo de botulismo, da confusão de sexos ou do
desafio da abstinência forçada pelo governo. Então ele
saía e eu ficava em
casa, enquanto outros caras acumulavam meses de
experiência sexual. Toda
segunda-feira, eles chegavam ao colégio desgrenhados,
como se estivessem
exaustos de tanta ação no fim de semana. E toda
segunda-feira Johnny
Frackas me perguntava: ―Pegou alguém no fim de semana,
Frutinha?‖
Eu revidava
com uma resposta inteligente? Usava minha perspicácia e
meu domínio das palavras para elaborar a mãe de todas
as piadas-com-a-sua-
mãe? Me aproveitava do fato de Johnny ―Sardas‖ Frackas ser um alvo tão
fácil? Não. Nunca. Nem uma vez. Na verdade, eu nunca
respondi. Ficava
sentado como um maricas, encolhia os ombros mirrados de
maricas ou fingia
estar de repente muito interessado no livro de química.
Nunca disse uma única
palavra. E como me arrependo.
Por isso,
era óbvio que eu estava feliz de sair do St. Luke e me mudar
para Nova York. Estava mesmo na hora de uma
transformação — mas não
foi Nova York que me transformou em vampiro.
Talvez a
transformação toda tenha começado em Nova York, com aquela
garota no trem. Ela olhou para mim no instante em que
entrei e se dirigiu para
um assento perto do meu. Embora ela estivesse lendo um
livro grosso, me
encarava toda vez que mudava de parágrafo. Seus olhos
já haviam percorrido
as manchas avermelhadas nas minhas mãos e as ataduras
nos meus braços.
|
Então ela disse que sabia o que havia de errado comigo.
E ela parecia tão certa
daquilo, tão compreensiva, que eu concordei. Acho que
foi naquela hora que
decidi que minha vida precisava mudar.
Ou talvez a
necessidade de mudança tenha começado quinze anos e nove
meses antes, com a fertilização de dois óvulos muito
diferentes por dois
espermatozoides muito diferentes. Desculpe mencionar a
vida sexual dos
meus pais, mas foi assim que eu e Luke começamos. Minha
mãe liberou um
óvulo com seu entusiasmo e energia, e outro com suas
neuroses sociais e seu
sentimentalismo barato. Meu pai forneceu um
espermatozoide com suas
habilidades esportivas e sua simpatia, e outro com sua
tendência de se trancar
no quarto o fim de semana inteiro. O espermatozoide
legal encontrou o óvulo
legal e os dois foram dar uma volta na parte legal do
útero. Os encalhados se
juntaram por falta de opção e o resultado fui eu.
Os médicos
disseram à minha mãe que ela estava esperando gêmeos
bivitelinos, mais conhecidos como gêmeos fraternos.
Dois conjuntos
diferentes de genes. Dois bebês diferentes. Um absorveu
todos os nutrientes e
cresceu corpulento e saudável. O outro ficou subnutrido,
mas era muito
preguiçoso para começar uma briga por causa disso. Hoje
em dia, o primeiro
tem dez quilos a mais que o segundo.
Um de nós
recebeu o nome de Luke, o outro de Finbar. É difícil não
acreditar que o azar que me acompanhou a vida toda foi
confirmado pela
escolha desse nome.
Luke nasceu
em um mundo cheio de glória e admiração. E garotas. Meu
irmão foi banido do recreio do acampamento da
Associação Cristã de Moços
oito vezes no mesmo verão por ter sido beijado pelas
meninas. Foi totalmente
injusto. Luke não devia ter se dado mal — a vítima era
ele. Ele foi atacado
pelas meninas. E continua sendo, até hoje. Ele foi o
único aluno do primeiro
ano da nossa escola convidado para a festa de
formatura. Foi uma garota
asiática gostosa da Escola de Moças All Saints que o
convidou. E podem
acreditar: apesar do nome da escola, aquelas garotas
não eram todas santas.
Meu irmão chegou em casa com as calças alugadas viradas
do avesso.
|
As diferenças entre nós dois apareceram para valer
quando fizemos 12
|
anos. Luke chegou em casa de uma festinha com meninas e
meninos do bairro
e contou aos nossos pais que três garotas o haviam
beijado aquela noite. Tipo,
elas beijaram Luke. Na boca. Minha mãe, uma romântica
incurável, mas que
também tem pavor de doenças, ficou dividida entre o
horror e a curiosidade.
Ela resolveu o dilema perguntando todos os detalhes ao
meu irmão enquanto
o levava ao médico para um exame de mononucleose.
Eu também
queria saber mais sobre aqueles beijos (um deles tinha sido
daquela menina que usava um terço junto com um top
frente-única?), mas
quando perguntei Luke já tinha se distraído à procura
de uma barra de cereais.
Você pode estar se perguntando onde eu estava enquanto
rolava essa pegação
toda no porão da casa da Mary. Eu estava lá. Na mesma
festa. Mas o Luke
estava no porão e eu estava lá em cima, vendo o Henry
Kim jogar paciência.
P.S.: A única coisa mais patética do que jogar
paciência numa festa, mesmo
numa festa da sétima série, é ficar vendo outra pessoa
jogar paciência. Além
disso, eu não tinha a menor ideia dos beijos que
estavam rolando no porão.
Eu sempre perdia todos os amassos.
Já que
contar aos meus pais que eu estava sozinho com outro cara
enquanto todo mundo beijava as meninas no porão podia
passar a impressão
errada, só encolhi os ombros quando eles perguntaram: “E você, Finbar?”
Não é que eu não esteja interessado em garotas.
Pergunte ao padre que
ouve minha confissão todos os meses. Eu estou muito
interessado nelas. Para
falar a verdade, me interesso por garotas toda manhã
durante mais ou menos
seis minutos no chuveiro. Minha libido é igualzinha à
do Bill Clinton. Até a
minha obsessão por livros deve ter sido causada por
minha libido excessiva.
Especialmente pela bibliotecária da seção infantil da Biblioteca de
Alexandria.
Ela tinha
peitos enormes. Gigantes, na verdade. Cada um era do tamanho
de uma bola de boliche. Juro. Assim, desde os meus
tempos de Era uma vez um
troninho, associo
a leitura a tudo que o corpo feminino representa: conforto,
suavidade, sensualidade, vínculo materno, nutrição,
sensação de bem-estar... e
peitos.
Já que não saio muito, o amor e o sexo, na minha
cabeça, estão
relacionados a livros e filmes. Já vivi a vida de
Heathcliff, Romeu, Rhett
|
Butler, George Clooney,
Harrison Ford e James Bond. Da segurança do
meu
quarto, é fácil acreditar que posso ser tão
conquistador e corajoso quanto
qualquer um desses caras. Minha mãe também encontra
essas coisas nos
livros. Quer dizer, não sexo. Ela é católica fervorosa,
mas adora histórias de
amor. Como um cão de caça, ela farejou essa veia
romântica que eu tentei
esconder. Virei uma companhia para ela, seu parceiro de
comédia romântica,
seu Clube do Livro da Oprah particular. Digamos apenas
que eu sei mais
sobre a evolução da cor do cabelo da Katherine Heigl do
que qualquer
homem deveria saber.
A velha me
estragou, de várias maneiras.
As comédias
românticas da minha mãe me fizeram crer que as garotas
querem caras atenciosos, confiáveis e românticos. Claro
que, quando o filme
começa, ela está com um egocêntrico numa Ferrari. Mas
aos poucos vai
prestando atenção no cara que sabe qual é a flor que
ela mais gosta, o sujeito
que a salva de uma festa à fantasia em que ela é a
única fantasiada e que
garante que a inteligência dela a faz ser muito mais
sexy do que a irmã, modelo
da Playboy. O público todo se derrete quando o cara faz
um discurso sincero
sobre as verdadeiras razões pelas quais ama a garota. A
falta de jeito e a
esquisitice dele apenas o deixam com um ar sonhador.
Esse é o cara que eu
poderia ser. Aliás, esse é o cara que eu sou.
E daí? As garotas da escola me odeiam.
Os caras que
pegam mulher no colégio buzinam e gritam para garotas de
saias curtas. Eles viram doses de vodca nas festas da
escola para criar coragem
enquanto tentam levantar o vestido das meninas. Eles
tiram sarro delas nos
jogos de futebol porque elas enfiam a calça dentro da
bota; eles anotam o
número de telefone das garotas no celular como ―Loira‖ ou ―Morena‖, porque
nunca perguntam o nome delas e não estão nem um pouco
interessados em
saber. Ou porque realmente esqueceram. É assim que o
Luke é com as
garotas. É por isso que ele fica com elas — e na
verdade, já que estamos
falando de garotas, tudo começou com uma.
Foi assim
que aconteceu.
Celine.
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário