quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Capítulo 3 (O Simbolo Perdido)



CAPÍTULO 3

Robert Langdon estava ocupado relendo suas fichas de anotações quando o barulho dos pneus
do carro mudou de tom. Ele ergueu os olhos, surpreso ao ver onde estavam. Já chegamos à
Memorial Bridge?
Largou as anotações e olhou para fora, fitando as águas mansas do Potomac que corriam logo
abaixo. Uma bruma pesada pairava sobre a superfície do rio. Aquele local, muito apropriadamente
chamado de Foggy Bottom, sempre lhe parecera singular para se construir a capital do país. De todos
os lugares do Novo Mundo, os pais fundadores haviam escolhido um brejo lamacento à beira de um
rio para assentar a pedra angular de sua sociedade utópica. Langdon olhou para a esquerda, para além
da pequena enseada conhecida como Tidal Basin, em direção à silhueta graciosamente arredondada
do Jefferson Memorial - o monumento em homenagem a Jefferson que muitos chamavam de Panteão
dos Estados Unidos da América. Bem na frente do carro, um segundo monumento, o Lincoln
Memorial, se erguia com rígida austeridade, lembrando com suas linhas ortogonais o antigo Partenon
de Atenas. Mas foi mais adiante que Langdon viu a peça central da cidade - a mesma coluna que
avistara do céu. Sua inspiração arquitetônica era muito, muito mais antiga do que os romanos ou os
gregos.
O obelisco egípcio dos Estados Unidos.
A coluna monolítica do Monumento a Washington assomava bem à frente, iluminada contra o
céu como o majestoso mastro de um navio. Da perspectiva oblíqua de Langdon, o obelisco parecia
suspenso... Oscilando no céu soturno como se estivesse num mar agitado. Langdon se sentia
igualmente sem chão. Sua visita a Washington tinha sido totalmente inesperada. Acordei hoje de
manhã imaginando um domingo tranquilo em casa... E agora estou a poucos minutos do Capitólio.
Naquela manhã, às 4h45, Langdon havia mergulhado em uma água completamente calma,
iniciando o dia como sempre fazia, percorrendo 50 vezes a piscina deserta de Harvard. Sua forma
física já não era exatamente a mesma de seus dias de estudante, quando jogava pólo aquático e era
um típico rapaz norte-americano, mas ele ainda era esbelto e tinha um corpo tonificado e respeitável
para um homem de 46 anos. A única diferença agora era a quantidade de esforço que precisava fazer
para mantê-lo assim.
Ao chegar em casa, por volta das seis, ele iniciou seu ritual matutino de moer manualmente os
grãos de café de Sumatra e saborear o aroma exótico que enchia sua cozinha. Naquela manhã,
porém, surpreendeu-se ao ver a luzinha vermelha piscando na secretária eletrônica. Quem é que liga
às seis da manhã de um domingo? Apertou o botão e escutou o recado. "Bom dia, professor


Langdon, sinto muitíssimo por ligar assim tão cedo." A voz educada hesitava perceptivelmente e
exibia um leve sotaque do sul dos Estados Unidos. "Meu nome é Anthony Jelbart e sou assistente
executivo de Peter Solomon. O Sr. Solomon me disse que o senhor costuma acordar cedo... Ele
precisa contatá-lo com urgência. Assim que receber este recado, será que poderia fazer a gentileza de
ligar direto para ele? O senhor já deve ter o novo número pessoal dele, mas caso não tenha é 202329-
5746."
Langdon sentiu uma súbita preocupação com seu velho amigo. Peter Solomon era um homem
cortês e de boas maneiras, com certeza não era do tipo que ligava no domingo, quando o dia ainda
mal nasceu, a menos que houvesse algo muito errado.
Langdon parou de fazer o café e foi depressa até o escritório retornar a ligação. Espero que ele
esteja bem.
Solomon era seu amigo e mentor e, embora fosse apenas 12 anos mais velho do que Langdon,
representava uma figura paterna para ele desde que se conheceram na Universidade de Princeton. Em
seu segundo ano, Langdon tivera de assistir a uma palestra vespertina de um renomado convidado, o
jovem historiador e filantropo Peter Solomon. Falando com um entusiasmo contagiante e
apresentando uma fascinante visão da semiótica e da história dos arquétipos, Solomon despertou em
Langdon o que mais tarde se transformaria numa paixão da vida inteira pelos símbolos. Mas não fora
o brilhante intelecto de Peter, e sim a humildade em seus bondosos olhos cinzentos, que dera a
Robert a coragem para lhe escrever uma carta de agradecimento. O estudante de segundo ano jamais
havia sonhado que um dos mais ricos e intrigantes jovens intelectuais dos Estados Unidos pudesse
lhe responder. Mas ele respondeu. E isso marcou o começo de uma amizade verdadeiramente
gratificante.
Célebre acadêmico cujos modos calmos desmentiam sua poderosa linhagem, Peter vinha da
riquíssima família Solomon, cujo nome podia ser visto em prédios e universidades de todo o país.
Assim como os Rothschild na Europa, os Solomon sempre carregaram consigo todo o imaginário da
realeza e do sucesso norte-americanos. Peter assumira a posição de chefe da família ainda jovem,
após a morte do pai. Agora, aos 58 anos, já havia ocupado os mais diversos cargos de poder ao longo
da vida. Atualmente, estava à frente do Instituto Smithsonian. Langdon de vez em quando provocava
Peter, dizendo que a única mácula em seu pedigree irretocável era o diploma de uma universidade de
segunda categoria, Yale.
Ao entrar em seu escritório, Langdon se espantou ao ver que também havia recebido um fax de
Peter.

Peter Solomon 




ESCRITÓRIO DO SECRETÁRIO INSTITUTO SMITHSONIAN

Bom dia, Robert,

Preciso falar com você imediatamente.
Por favor, me ligue hoje de manhã assim que puder no telefone 202 329-5746.
Peter

Langdon discou o número na mesma hora, sentando-se diante da escrivaninha de carvalho
esculpida à mão para esperar a ligação se completar.
– Escritório de Peter Solomon - atendeu a já conhecida voz do assistente. - Anthony falando.
Em que posso ajudar?
– Alô, aqui é Robert Langdon. O senhor me deixou um recado mais cedo...
– Sim, professor Langdon! - O rapaz pareceu aliviado. - Obrigado por retornar a ligação tão
depressa. O Sr. Solomon está ansioso para falar com o senhor. Deixe-me avisar a ele que está na
linha. Pode aguardar um momento?
– Claro. - Enquanto Langdon esperava Solomon atender, baixou os olhos para o nome de Peter
no cabeçalho do papel timbrado do Smithsonian e teve de sorrir. O clã dos Solomon não inclui
muitos preguiçosos. A árvore genealógica de Peter estava coalhada de magnatas dos negócios,
políticos influentes e cientistas consagrados, alguns dos quais haviam chegado a integrar a Real
Sociedade de Londres. O único membro vivo da família de Solomon, sua irmã caçula Katherine,
aparentemente herdara o gene da ciência, pois agora era uma das figuras mais importantes de uma
disciplina recente e inovadora chamada ciência noética.
Tudo isso é grego para mim, pensou Langdon, achando graça ao recordar a mal-sucedida
tentativa de Katherine de lhe explicar a ciência noética em uma festa na casa do irmão no ano
anterior. Langdon havia escutado com atenção e então respondido:
– Parece mais magia do que ciência. - Katherine piscara o olho, brincalhona.
– As duas são mais próximas do que você pensa, Robert. 
Então o assistente de Solomon voltou ao telefone.
– Sinto muito, o Sr. Solomon está tentando organizar uma teleconferência. As coisas por aqui
estão um pouco caóticas esta manhã.
– Não tem problema. Eu posso ligar depois.
– Na verdade, ele me pediu que lhe comunicasse o motivo da ligação, se o senhor não se
importar.


É claro que não me importo. - O assistente respirou fundo.
– Como o senhor já deve saber, professor, todos os anos aqui em Washington o conselho do
Smithsonian organiza um evento de gala para agradecer aos nossos mais generosos patrocinadores.
Boa parte da elite cultural do país comparece. - Langdon sabia que sua conta bancária tinha uma
quantidade de zeros pequena demais para incluí-lo na elite cultural, mas ficou imaginando se
Solomon iria convidá-lo mesmo assim.
– Este ano, como de costume - prosseguiu o assistente -, o jantar vai ser precedido por um
discurso de abertura. Tivemos a sorte de conseguir o Salão Nacional das Estátuas do Capitólio para
esse evento.
O melhor salão de toda a capital, pensou Langdon, recordando uma palestra política que
assistira certa vez no impressionante salão circular. Era difícil esquecer 500 cadeiras dobráveis
dispostas em um arco perfeito, cercadas por 38 estátuas em tamanho natural, em um lugar onde
outrora havia funcionado a primeira Câmara dos Representantes da nação.
– O problema é o seguinte - disse o assistente. - Nosso orador adoeceu e acabou de nos
informar que não vai poder fazer o discurso. - Ele fez uma pausa, constrangido. - Isso significa que
estamos desesperados atrás de um substituto. E o Sr. Solomon esperava que o senhor pudesse
considerar a possibilidade de cumprir essa função.
Langdon ficou surpreso.
– Eu? - Aquilo não era absolutamente o que ele imaginava. - Tenho certeza de que Peter pode
encontrar um substituto muito melhor.
– O senhor é a primeira escolha do Sr. Solomon, professor, e está sendo excessivamente
modesto. Os convidados do instituto ficariam encantados em ouvi-lo, e o Sr. Solomon pensou que o
senhor poderia dar a mesma palestra que fez no canal de TV Bookspan há alguns anos, o que acha?
Assim, não precisaria preparar nada. Ele disse que o tema era o simbolismo na arquitetura da nossa
capital... Parece perfeito para a ocasião.
Langdon não tinha tanta certeza.
– Se bem me lembro, essa palestra tinha mais a ver com a história maçônica do prédio do que...
– Exato! Como o senhor sabe, o Sr. Solomon é maçom, assim como muitos dos homens de
negócios que estarão presentes. Tenho certeza de que eles adorariam ouvi-lo falar sobre esse assunto.
Reconheço que seria fácil. Langdon guardava as anotações de todas as palestras que fazia.
– Acho que eu poderia pensar no assunto. Qual é a data do evento?
O assistente pigarreou, soando subitamente pouco à vontade.
– Bem, na verdade o evento é hoje à noite, professor. - Langdon deu uma sonora risada.
– Hoje à noite? 


É por isso que está um caos aqui esta manhã. O Smithsonian está em uma situação
profundamente embaraçosa... - O assistente começou a falar mais depressa. - O Sr. Solomon está
disposto a mandar um jatinho particular buscá-lo em Boston. O voo dura apenas uma hora, e o
senhor estaria de volta à sua casa antes da meia-noite. Conhece o terminal aéreo particular do
Aeroporto Logan, em Boston?
– Conheço - admitiu Langdon com relutância. Não é de espantar que Peter sempre consiga o
que quer.
– Maravilha! O senhor poderia encontrar o jatinho lá, digamos... Às cinco horas?
– O senhor não me deixa muita escolha, não é? - disse Langdon com uma risadinha.
– Eu só quero agradar ao Sr. Solomon, professor. - Peter tem esse efeito nas pessoas. Langdon
pensou no assunto por alguns instantes, sem ver nenhuma saída.
– Tudo bem. Diga a ele que eu topo.
– Incrível! - exclamou o assistente, parecendo profundamente aliviado. Então, deu a Langdon o
número da aeronave e várias outras informações. Quando Langdon finalmente desligou, pensou se
Peter Solomon algum dia havia escutado um não.
Voltando a preparar seu café, Langdon pôs mais alguns grãos dentro do moedor. Um pouco de
cafeína extra hoje de manhã, pensou. O dia vai ser longo.

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