quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Capítulo 19 (O Simbolo Perdido)



CAPÍTULO 19

A diretora Inoue Sato estava em pé, de braços cruzados, olhando com ceticismo para Langdon
enquanto processava o que ele havia acabado de lhe dizer.
– Ele disse que quer que o senhor destranque um antigo portal? O que é que eu faço com essa
informação, professor? - Langdon deu de ombros, desanimado. Estava se sentindo mal novamente e
tentou não baixar os olhos para a mão cortada do amigo.
– Foi exatamente isso que ele me falou. Um antigo portal... Escondido em algum lugar na
cidade, acho que neste prédio. Eu disse a ele que não sabia de portal nenhum.
– Então por que é que ele acha que o senhor pode encontrá-lo?
– Evidentemente ele é louco. - Ele disse que Peter iria apontar o caminho. Langdon baixou o
olhar para o dedo esticado de Peter, sentindo-se novamente enojado pelo sádico jogo de palavras de
seu captor. Peter apontará o caminho. Langdon já havia permitido que seus olhos seguissem a
direção do dedo, que indicava a cúpula. Um portal? Lá em cima? Loucura.
– Esse homem que me ligou - disse Langdon a Sato - e é a única pessoa que sabia que eu
estaria no Capitólio hoje à noite, então, quem quer que tenha informado à senhora que eu estava aqui
é o principal suspeito. Eu recomendo...
– Não é da sua conta onde eu obtive minhas informações - interrompeu Sato, com a voz cada
vez mais incisiva. - Minha prioridade máxima neste momento é cooperar com esse homem, e eu
tenho informações que sugerem que o senhor é o único capaz de dar o que ele quer.
– E a minha prioridade máxima é encontrar meu amigo. - Retrucou Langdon, frustrado.
Sato respirou fundo, evidentemente se esforçando para não perder a paciência.
– Se quisermos encontrar o Sr. Solomon, só temos um curso de ação possível, professor:
começar a cooperar com a única pessoa que parece saber onde ele está. - Sato verificou o relógio de
pulso. - Nosso tempo é limitado. Posso lhe garantir que é essencial atendermos rapidamente às
exigências desse homem.
– Como? - Perguntou Langdon, incrédulo. - Localizando e destrancando um antigo portal? Não
existe portal nenhum, diretora Sato. Esse cara é maluco.
Sato chegou mais perto, parando a menos de meio metro de Langdon.
– Permita-me observar... Que o seu maluco já manipulou com habilidade dois indivíduos
relativamente inteligentes hoje de manhã. - Ela encarou Langdon e, em seguida, olhou de relance
para Anderson. - No meu trabalho, nós aprendemos que a fronteira entre insanidade e genialidade é
tênue. Seria sensato de nossa parte ter um pouco de respeito por esse homem.


– Ele cortou a mão de uma pessoa!
– Justamente. Isso está longe de ser o comportamento de um indivíduo indeciso ou hesitante.
Mais importante ainda, professor, esse homem obviamente acredita que o senhor pode ajudá-lo. Ele o
trouxe até Washington e deve ter feito isso por um motivo.
– Ele falou que o único motivo pelo qual pensa que eu posso destrancar esse "portal" é que
Peter lhe disse que eu poderia fazer isso. - Rebateu Langdon.
– E por que Peter Solomon diria isso se não fosse verdade?
– Tenho certeza de que Peter não falou nada disso. E, se falou, ele o fez sob pressão. Estava
confuso... Ou amedrontado.
– Sim. Isso se chama interrogatório sob tortura e é bastante eficaz. Mais razão ainda para o Sr.
Solomon dizer a verdade. - Sato falava como se conhecesse a técnica por experiência própria. - Ele
explicou por que Peter acha que só o senhor pode destrancar o portal? - Langdon fez que não com a
cabeça.
– Professor, se a sua reputação estiver correta, então o senhor e Peter Solomon compartilham
um interesse por este tipo de coisa: segredos, fatos históricos esotéricos, misticismo e assim por
diante. Em todas as suas conversas com Peter, ele nunca mencionou sequer uma vez nada sobre
algum portal secreto aqui em Washington?
Langdon mal podia acreditar que uma alta funcionária da CIA estava lhe fazendo uma pergunta
dessas.
– Tenho certeza que não. Peter e eu conversamos sobre coisas bem misteriosas, mas pode
acreditar: se ele algum dia me dissesse que existe um antigo portal escondido em qualquer lugar, eu o
mandaria procurar um médico para ver se estava tudo bem com a sua cabeça. Ainda mais um portal
que conduz aos Antigos Mistérios.
Ela ergueu os olhos.
– Como assim? O homem lhe disse especificamente aonde este portal pode levar?
– Disse, mas não precisava. - Langdon indicou a mão com um gesto. - A Mão dos Mistérios é
um convite formal para se atravessar um portal místico e obter conhecimentos secretos ancestrais,
um poderoso saber conhecido como Antigos Mistérios... Ou o saber perdido de todas as épocas.
– Então, o senhor já ouviu falar no segredo que ele acredita estar escondido aqui.
– Muitos historiadores já ouviram.
– Então como o senhor pode dizer que o portal não existe?
– Com todo o respeito, minha senhora, todos nós já ouvimos falar na Fonte da Juventude e em
Shangri-la, mas isso não significa que existam.
O chiado alto do rádio de Anderson os interrompeu.
 

– Chefe? - disse a voz no rádio. Anderson arrancou o aparelho do cinto.
– Anderson falando.
– Senhor, já concluímos a busca do local. Ninguém aqui dentro corresponde à descrição. Mais
alguma ordem, senhor? - Anderson lançou um olhar rápido para Sato, claramente esperando uma
reprimenda, mas a diretora não parecia interessada. Ele se afastou um pouco dos dois, falando
baixinho no rádio.
Sato estava totalmente concentrada em Langdon.
– Está querendo dizer que o segredo que ele acredita estar escondido em Washington... É uma
fantasia?
Langdon assentiu.
– Um mito muito antigo. Na verdade, o segredo dos Antigos Mistérios é anterior ao
cristianismo. Tem milhares de anos.
– E mesmo assim continua vivo?
– Assim como várias crenças igualmente improváveis. - Langdon muitas vezes lembrava a seus
alunos que a maioria das religiões modernas incluía histórias que não resistiam ao escrutínio
científico: desde Moisés abrindo o mar Vermelho até Joseph Smith usando óculos mágicos para
traduzir o Livro de Mórmon a partir de uma série de placas de ouro que encontrou enterradas no
norte do estado de Nova York. A aceitação generalizada de uma ideia não é prova de sua validade.
– Entendo. Então o que são exatamente esses... Antigos Mistérios?
Langdon suspirou. A senhora tem algumas semanas?
– Resumidamente, os Antigos Mistérios se referem a um conjunto de conhecimentos secretos
reunidos muito tempo atrás. Um dos aspectos intrigantes desse conhecimento é que ele supostamente
permite àquele que o detém entrar em contato com poderosas habilidades adormecidas dentro da
mente humana. Os adeptos esclarecidos que possuíam esse conhecimento juraram mantê-lo
escondido das massas, porque ele era considerado poderoso e perigoso demais para os não iniciados.
– Perigoso de que forma?
– As informações foram ocultadas pelo mesmo motivo que mantemos fósforos fora do alcance
das crianças. Nas mãos corretas, o fogo pode proporcionar luz... Mas, nas mãos erradas, ele pode ser
altamente destrutivo.
Sato tirou os óculos e estudou Langdon.
– Diga-me, professor, o senhor acredita que essas informações poderosas possam realmente
existir?
Langdon não sabia ao certo como responder. Os Antigos Mistérios sempre tinham sido o maior
paradoxo de sua carreira acadêmica. Praticamente todas as tradições místicas da Terra giravam em


torno da ideia de que havia um conhecimento misterioso capaz de dotar os seres humanos de poderes
sobrenaturais, quase como os de um deus: o tarô e o I Ching davam ao homem a capacidade de ver o
futuro; a alquimia, por sua vez, concedia a imortalidade graças à lendária pedra filosofal; a wicca
permitia aos praticantes avançados conjurar poderosos feitiços. A lista não tinha fim. Como
acadêmico, Langdon não podia negar o registro histórico dessas tradições - tesouros incalculáveis de
documentos, artefatos e obras de arte que, de fato, sugeriam claramente que os antigos possuíam um
poderoso saber que só compartilhavam por meio de alegorias, mitos e símbolos, garantindo, assim,
que apenas os devidamente iniciados pudessem ter acesso aos seus poderes. Mesmo assim, sendo
realista e cético, Langdon ainda não estava convencido.
– Digamos apenas que eu sou um cético. - Disse ele a Sato. - Nunca vi nada no mundo real que
sugerisse que os Antigos Mistérios são algo mais do que uma lenda, um arquétipo mitológico
recorrente. Parece-me que, se fosse possível para os humanos adquirir poderes milagrosos, haveria
provas disso. Mas até agora a história não nos deu nenhum homem com poderes sobre-humanos.
Sato arqueou as sobrancelhas.
– Isso não é totalmente verdade.
Langdon hesitou ao perceber que, para muitas pessoas religiosas, havia de fato um precedente
para deuses humanos, dos quais Jesus era o mais evidente.
É verdade - disse ele - que muitas pessoas instruídas acreditam nesse conhecimento capaz de
conferir poder, mas ainda não estou convencido.
– Peter Solomon é uma dessas pessoas? - Perguntou a diretora, olhando de relance para a mão
no piso da Rotunda. Langdon não conseguiu se forçar a olhar novamente para a mão.
– Peter vem de uma família que sempre teve paixão por todo tipo de coisa antiga e mística.
– Então, a resposta é sim? - Indagou Sato.
– Posso garantir à senhora que, ainda que Peter acredite que os Antigos Mistérios sejam
verdadeiros, ele não crê que seja possível acessá-los atravessando algum tipo de portal escondido em
Washington. Ele entende o conceito de simbolismo metafórico, algo que evidentemente não se pode
dizer de seu sequestrador.
Sato aquiesceu.
– Então o senhor acredita que esse portal é uma metáfora?
É claro. - Disse Langdon. - Pelo menos em teoria. É uma metáfora bem comum: um portal
místico que se deve atravessar de modo a alcançar a iluminação. Portais e portas são construtos
simbólicos recorrentes, que representam ritos de passagem transformadores. Procurar um portal
literal seria como tentar localizar os verdadeiros Portões do Paraíso.
Sato pareceu refletir sobre a questão por alguns instantes.
 

– Mas me parece que o homem que sequestrou o Sr. Solomon acredita que o  senhor é capaz de
destrancar um portal de verdade.
Langdon soltou o ar com força.
– Ele cometeu o mesmo erro de muito zelotes: confundir metáforas  com  realidade. De modo
semelhante, os alquimistas primitivos se esforçaram em vão para converter chumbo em ouro sem
nunca perceber que essa transformação nada mais era do que uma metáfora para a exploração do
verdadeiro potencial humano: pegar uma mente obtusa, ignorante, e transmudá-la em uma mente
brilhante e iluminada.
Sato gesticulou em direção à mão.
– Se esse homem quer que o senhor localize algum tipo de portal para ele, por que
simplesmente não lhe diz como encontrá-lo? Por que toda essa encenação? Por que lhe dar a mão
tatuada de alguém?
Langdon havia feito a mesma pergunta a si mesmo, e a resposta era perturbadora.
– Bem, parece que o homem com quem estamos lidando, além de mentalmente instável, é
muito instruído. A mão é uma prova de que ele é versado nos Mistérios, assim como em seus códigos
de confidencialidade. Sem mencionar seus conhecimentos relativos à história desta sala.
– Não estou entendendo.
– Tudo o que ele fez hoje à noite se encaixa perfeitamente nos protocolos antigos.
Tradicionalmente, a Mão dos Mistérios é um convite sagrado, devendo, portanto, ser feito em um
local igualmente sagrado.
Os olhos de Sato se estreitaram.
– Estamos na Rotunda do Capitólio dos Estados Unidos, professor, não em um altar sagrado
dedicado a antigos segredos místicos.
– Na verdade, minha senhora - disse Langdon -, conheço um grande número de historiadores
que iriam discordar.

Nesse mesmo instante, do outro lado da cidade, Trish Dunne estava sentada dentro do Cubo
diante do brilho do telão de plasma. Terminou de preparar seu spider de busca e digitou as cinco
expressões-chave que Katherine havia lhe passado. Isso não vai dar em nada.
Sentindo-se pouco otimista, ela acionou o spider, dando início a uma pescaria por toda a rede.
A uma velocidade estonteante, as expressões passaram a ser comparadas a textos espalhados pelo
mundo todo... Em busca de uma correspondência perfeita.
Era inevitável que Trish se perguntasse qual era o sentido daquilo, mas ela já havia aprendido a
aceitar que trabalhar para os Solomon significava nunca conhecer todos os fatos.

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